Margarida Porete — O Espelho das Almas Simples Excertos de "Le Miroir des âmes simples et anéanties et qui seulement demeurent en vouloir et désir d'amour", traduzidos por Yara Azeredo Marino e Elisabete Abreu
Razão
Em nome de Deus, que fazem então aqueles cujo estado de espírito está acima de seus pensamentos?
Amor
Unem-se àquele que está no cimo da montanha, unindo-se àquele que está no fundo de seu vale, por um não-pensar oculto e selado na clausura secreta da mais elevada pureza dessa excelente alma; essa clausura não pode ser aberta por ninguém — ou descoberta, fechada ao estar aberta — a menos que o amável 'Longe-Perto', ao mesmo tempo muito longe e muito perto, não a encerre ou não a abra: ele é o único que possui as chaves, e nenhum outro as carrega nem mesmo o poderia. (Às almas liberadas-?! E vós todas, senhoras, a quem Deus, em sua bondade divina, concedeu esta vida abundante e sem retorno — e não somente a vida da qual falamos, mas, com ela, aquela que ninguém jamais falou —, vós conhecereis nesse livro vosso exercício. Quanto às almas que não são assim, estas nunca o foram nem serão. Elas não sentirão nem conhecerão esse estado; isso lhes é e continuará impossível: elas não são de forma alguma, sabei-o, da linhagem da qual falamos, não mais do que os anjos da primeira ordem não são os Serafins nem o podem ser, pois Deus não lhes concedeu o estado dos Serafins. E as almas que não são ainda tais — senão já em Deus, e é por isso que elas o serão um dia — conhecerão esse estado e o sentimento mais fortemente ainda do que jamais o conheceram ou sentiram, devido à linhagem à qual pertencem e pertencerão. Mas as pessoas de quem falamos, que já são tais e continuarão a sê-lo, reconhecerão desde que a compreendam, sabei-o, a linhagem à qual pertencem.