Livros de Enoque

JUDAÍSMO — LIVROS DE ENOQUE

Francês, Inglês

VIDE: ENOQUE 3
Cabala
Harold Bloom: (Excertos de “PRESSÁGIOS DO MILÊNIO”)

Aquilo a que hoje nos referimos como os Livros de Enoque só está preservado inteiramente na antiga língua etíope, mas fragmentos descobertos entre os Manuscritos do Mar Morto demonstram que a língua original do livro era o aramaico, falado pelos judeus e pelos povos siríacos vizinhos durante vários séculos, antes e depois do início da Era Comum. O aramaico, segundo algumas tradições, é a língua dos anjos, o que torna apropriado que Enoque compusesse nessa língua (embora outras tradições insistam em que os anjos só falam hebraico).

Enoque 1 é uma experiência de leitura selvagem, mais encontrável hoje na tradução de E. Isaac em “/2”. Numa notável ampliação de Gênesis 6:1-4, o autor de Enoque 1 começa com a descida de uns duzentos anjos luxuriosos, que baixam no cume do Monte Hennon à caça das belas filhas dos homens. São comandados por Semyaz, que depois se tornou o grego Orion, assim punido perpetuamente como uma figura de cabeça para baixo. Após acasalarem-se com mulheres terrenas, os anjos caídos geram filhos gigantes, de apetite voraz, que devoram sucessivamente alimentos vegetais, animais, pessoas e uns aos outros.

Contemplando esse horror, e a terrível doutrina de magia e bruxaria de Azaz’el, um dos demônios, Deus manda um dilúvio sobre a terra, e ordena ao arcanjo Rafael que enterre Azaz’el sob as pedras da terra devastada. Exatamente neste ponto, o virtuoso escriba Enoque entra na narrativa. Numa visão em sonho, os Vigilantes ou anjos mandam Enoque repreender e advertir os anjos caídos sobre o que os espera. Mas primeiro Enoque ascende ao trono de Deus, numa região de fogo, e lhe é permitido ficar diante de Deus. Segue-se uma série de viagens celestes, uma espécie de tour dos domínios angélicos e de todos os segredos do cosmo. Entre estes está a epifania de um filho messiânico do povo (talvez enganosamente traduzido por Isaac com a conotação hoje cristã de “Filho do Homem”), além de tableaux da ressurreição dos mortos e do julgamento final dos pecadores.

O Enoque etíope, apesar de toda a sua vividez, é apequenado pelo esplendor apocalíptico e os rigores de Enoque 3, uma obra escrita em hebraico, provavelmente no século 5 da E.C., e brilhantemente traduzida por P. Alexander no Pseudepigrapha de Charlesworth. Essa visão rapsódica parece ser obra do grande rabino Ishmael, assassinado pelos romanos como um dos prelúdios à insurreição de Bar Kokhba em 132 E.C., mas indubitavelmente a data da composição é muito posterior. Como apocalipse, Enoque 3 pertence à tradição pré-cabalista de gnose hebraica chamada de misticismo Merkabah, sendo Merkabah o termo do profeta Ezequiel para a carruagem que conduz o Homem Entronizado de sua visão. Nessa tradição, o visionário viaja pelos aposentos celestes até chegar ao trono de Deus, onde lhe é confiada uma revelação. Mas, como estamos dentro do mundo normativo rabínico, a revelação é seriamente restringida; a exuberante invenção do texto gnóstico seria uma violação do decoro e da autoridade escriturai recebida.


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