Jesus subiu ao monte

Agostinho de Hipona — SERMÃO DA MONTANHA

Eis o início do sermão:

“Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte. Ao sentar-se aproximaram-se dele os seus discípulos. E abrindo sua boca os ensinava, dizendo…” (Mt 5,1.2).

Se me perguntarem o que significa esse monte, responderei que pode muito bem representar a superioridade dos preceitos da nova justiça em comparação com a antiga lei judaica. O único e mesmo Deus adaptou-se muito bem ao ordenado curso dos tempos. Por meio de santos profetas e fiéis servidores deu preceitos menos perfeitos ao povo que convinha ainda sujeitar pelo temor. E por meio de seu Filho deu outros preceitos muito mais perfeitos ao povo que ele queria libertar pela caridade.

Com efeito, esta distribuição de preceitos menos e mais perfeitos, em harmonia com pessoas e tempo, foi ordenada por aquele que sabe adaptar ao tempo oportuno o remédio conveniente aos males do gênero humano. E não é de estranhar que sejam dados preceitos mais perfeitos em vista do Reino dos Céus e preceitos menos perfeitos em vista dos reinos da terra, pelo mesmo e único Deus que fez o céu e a terra. Dessa justiça mais perfeita é que disse o profeta: “A tua justiça é como os montes de Deus” (SI 35,7). E está ela bem simbolizada pelo monte de onde ensina o único Mestre — só ele idôneo para ensinar-nos tantas verdades.

O Senhor ensina sentado, o que corresponde à dignidade de seu magistério. Acercam-se dele os discípulos, a fim de que aqueles cujos corações aproximavam-se mais, pelo cumprimento de seus preceitos, estivessem também mais próximos, corporalmente, na audição de suas palavras.

“E abrindo sua boca os ensinava dizendo…” Esse circunlóquio: “E abrindo sua boca”, talvez queira significar que o discurso será algo mais longo do que das outras vezes. A menos que se prefira entender que o evangelista quis consignar com precisão que o Senhor abriu sua própria boca, porquanto o mesmo, na Lei antiga, costumava abrir a boca dos profetas.