Homem Tradição Egípcia e Judaica [VPRJ]

Jean Tourniac — Vida Póstuma e Ressurreição no Judeu-Cristianismo [VPRJ]

A constituição do ser humano no judaísmo

Comparação entre tradições egípcia e judaica

No “Livro dos Mortos” egípcio, encontra-se a seguinte descrição da individualidade humana:

  • uma primeira divisão: corpo físico + alma + Espírito + “duplo” (ou Anjo da Guarda + corpo glorioso,
  • uma segunda divisão mais detalhada:
    • A — corpo grosseiro
    • B — o “ka”, fundamento estável do estado sutil post-mortem, vivente, ativo e que se substitui ao corpo grosseiro do estado precedente de vida terrestre.
      • Tem uma estabilidade absoluta, parte de um ponto de apoio interior e tende para a periferia: “centrífuga” (enquanto na vida terrestre, o ser é “centrípeta”).
      • Análogo ao corpo vital hindu ou “pranaçarira” segundo alguns,
      • qualificado de “duplo etérico”, em todos os pontos semelhante ao corpo físico mas desprovido de elementos próprios à manifestação material
      • tem necessidade de uma “efígie do morto”: múmia por semelhança, e de um embalçamento para ser preservado (o “ka” vai parelho com a preservação do cadáver)
      • garante ao defunto: vitalidade, estabilidade, força
    • C — o “khaibit” (a sombra), a alma inferior, animal, sensorial, forma dos desejos animais, vícios, paixões; pode ser facilmente destruída post-mortem em razão de sua corrupção; sua manifestação é aquele de um fantasma (sukshmaçarira dos hindus, “casca” do cabalistas)
    • D — o “ba”: a alma gêmea com “ib”, seu coração. É a alma superior, capaz de raciocínio, reflexão, juízo, decisões lúcidas.
      • Ameaçada pela segunda morte, que se traduz pela perda gradual da consciência. Se verá a respeito do cristianismo o que representa esta segunda morte.
      • Tem necessidade de oferendas em natureza (orações)
      • Suscetível de deslocamento dinâmicos e de percorrer toda a gama de metamorfoses
    • E — “iakhu”, “khu”: o espírito, vida defunto condicionada por:
      • justificação
      • purificação ritual
      • santificação (manas hindu), paraíso, paz
    • F — “sahu”: corpo glorioso: o Espírito tendo recebido o selo da consagração e da iluminação.
      • Sublimação e redenção do ser inteiro (corpo compreendido)

Poderia se comparar com o judaísmo e com o cristianismo. Neste último caso no entanto:

  • A, B e C = se chamam comumente a alma
  • D = o Espírito

No judaísmo o homem de carne é a Alma vivente, seja C + B + A + carne animada pelo Espírito D e E.

Mas no cristianismo a vitória sobre os “poderes da morte” ao Gólgota e o “cadáver tornado fonte de vida”, se integram na consciência do crente, o preparando à “passagem da soleira”; os venenos de destruição da individualidade humana são então neutralizados pela destruição da morte.

O Cristo morte em cruz age como um “magistério” no subconsciente durante a “vida terrestre” e depois (de onde a caveira pendurada no rosário franciscano com, do outro lado, a cabeça do Cristo). A ressurreição do Cristo é dinâmica e efetiva, ela recria o estado do homem original, diante da queda. Também aqueles que negavam a ressurreição “carnal” do Cristo, os gnósticos, não representavam eles o Crucificado.

Note-se que o ser o post-mortem, na perspectiva egípcia, está amputado do cérebro, do coração, da percepção sensorial, em resumo é preciso que sua “consciência” suplantada a tudo isto pela “reeducação” e “adaptação” e em uma atmosfera de “dissolução”, “distúrbios”, ao redor dela: correntes desconhecidas que a sacodem e que ela não domina, metamorfoses mesmo — exatamente como no estado de sono —, ambiente que “o observa, o espia”, seja com benevolência, seja com hostilidade; um conjunto fluido, desconhecido, indeterminado, vago, em uma sensação de dependência da alma. Encontra-se ceras descrições do Bardo Todol ou do “Inferno” de Dante.