Filemão Hesicasmo

Abade Filemão — Discurso muito útil

Ele lhe disse então: «É preciso pela hesychia purificar totalmente a inteligência (nous) e lhe dar um trabalho espiritual incessante. Pois, assim como o olho se volta para as coisas sensíveis e admira o que vê, a inteligência pura se volta para as coisas inteligíveis, saindo de si mesma sob o efeito da contemplação espiritual (theoria), e retorna dificilmente de seu êxtase. Do mesmo modo para a hesychia que se desprende e se libera das paixões (pathos), quanto mais se torna digna do conhecimento (gnosis).

«Se queres alcançar estas virtudes, não se preocupe com homem nenhum, fuja do mundo, vá de todo teu coração pelo caminho dos santos, tenha negligência quanto a sua aparência…. Que teu comportamento seja simples, tua fala igual, tua atitude discreta, tua voz natural. Viva na pobreza e seja desprezado por todos. Sobretudo, guarde tua inteligência, mantenha a sobriedade e a vigilância (nepsis), suporte com paciência todos os perigos e conserve intacto todos os bens que te sejam dados. Enfim, seja rigorosamente atento a ti mesmo, para não acolher qualquer prazer que entre em ti a sua revelia. Pois as paixões da alma estão adormecidas pela hesychia.

«É um grande combate (agon) e um grande temor guardar a alma. É necessária a separação do mundo inteiro, o afastamento de toda paixão da alma para com o corpo, o não ter nem cidade, nem morada, nem nada próprio, nem dinheiro, nem domínio, nem o que se ocupar, nem ligação com outros, sendo ignorante das coisas humanas, humilde, condescendente, bom, doce, calmo, pronto a receber em teu coração as marcas que deixa o conhecimento divino (gnosis).

«Tal foi o coração dos santos: totalmente separado da vida que se leva no mundo. Guardando límpido neles mesmos o pensamento do céu, os santos receberam a luz das leis divinas. Brilharam através de suas obras e suas palavras piedosas, mortificando pela temperança, o temor e o desejo de Deus seus membros que estão na terra. Com efeito, graças a oração contínua e à meditação das divinas Escrituras, os olhos da inteligência da alma se abrem e veem o Senhor dos Poderes, uma grande alegria e um desejo violento toma conta da alma em brasas, e quando a carne também é levada pelo Espírito, o homem se torna inteiramente espiritual. É porque aqueles que obram na hesychia bem-aventurada, que levam a vida mais estrita e que se separam de todo reconforto humano, se entretêm em toda pureza com o Mestre que está nos céus: sós com o só.»

Quando ouviu estas palavras, este irmão amado de Deus, a alma mortificada pelo desejo divino, ganhou com ele Sceta, onde os maiores dos santos Padres tinham conduzido a bom termo o curso da piedade. Permaneceram na laura de João Colobos, depois de ter deixado ao ecônomo da laura o cuidado de se ocupar deles, pois queriam viver na hesychia. Pela graça de Deus, eles viviam em toda hesychia, mas saiam discretamente, o sábado e o domingo. E os outros dias da semana, cada uma se aplicava pacientemente a fazer suas orações e suas liturgias. Tal era a liturgia do santo ancião: a noite, cantava pacientemente todo o saltério e as odes, e recitava uma passagem do Evangelho. Em seguida assentava-se e dizia nele mesmo: «Senhor, tende piedade», com uma tal tensão e tanto tempo que não podia mais pronunciar estas palavras. Tirava então uma soneca e ao amanhecer cantava de novo na primeira hora, se assentava em seu assento, voltado para o oriente, salmodiava em seguindo a ordem do ofício, e de novo dizia de cor passagens do Apóstolo e do Evangelho. Passava assim todo o dia, cantando e orando sem descansar e alimentado pela contemplação das coisas do céu, a ponto que frequentemente sua inteligência se elevava na contemplação e que não sabia mais se estava sobre a terra.

O vendo assim inflexivelmente tencionado na realização das liturgias e totalmente transformado pelos pensamentos divinos, o irmão lhe disse: «Que tens Pai, velho como é, a te dar assim provações, em mortificando e escravizando teu corpo?» Mas ele lhe respondeu: «Creia-me, meu filho, é Deus que pôs em minha alma um tal ardor e um tal desejo da liturgia, pois sou incapaz de ir por mim mesmo ao limite desta tensão. O desejo de Deus e a esperança dos bens a vir são mais fortes que a fraqueza do corpo». Todo o desejo de sua inteligência estava assim levado para o céu como por asas tanto na hora das refeições quanto nos outros momentos.