Evangelho de Tomé – Logion 74

Pla

Ele disse: Senhor: há muitos ao redor dos poços mas não há ninguém nos poços.

Puech

74. Il a dit : Seigneur [On pourrait aussi traduire, mais en modifiant ou corrigeant le texte : « le Seigneur a dit ».], il y en a beaucoup autour du puits, mais il n’y a personne dans le puits.


Suarez

1 Il a dit : 2 Seigneur ! Il y en a beaucoup autour du puits, 3 mais personne dans le puits.

Meyer

74 Someone said,[Lit., “He said.”] “Master,[Or “Lord.”] there are many around the drinking trough, but there is nothing [Or “no one.”] in the .” [The Coptic text has šne, “illness,” here emended to read še, “.”]

Canônicos

Então o anjo do Senhor, achando-a junto a uma fonte no deserto, a fonte que está no caminho de Sur, perguntou-lhe: Agar, serva de Sarai, donde vieste, e para onde vais? Respondeu ela: Da presença de Sarai, minha senhora, vou fugindo. Disse-lhe o anjo do Senhor: Torna-te para tua senhora, e humilha-te debaixo das suas mãos. Disse-lhe mais o anjo do Senhor: Multiplicarei sobremaneira a tua descendência, de modo que não será contada, por numerosa que será. Disse-lhe ainda o anjo do Senhor: Eis que concebeste, e terás um filho, a quem chamarás Ismael; porquanto o Senhor ouviu a tua aflição. Ele será como um jumento selvagem entre os homens; a sua mão será contra todos, e a mão de todos contra ele; e habitará diante da face de todos os seus irmãos. E ela chamou, o nome do Senhor, que com ela falava, El-Rói; pois disse: Não tenho eu também olhado neste lugar para aquele que me vê? Pelo que se chamou aquele poço Beer-Laai-Rói; ele está entre Cades e Berede. (Gen 16, 7-14)


Comentários

Roberto Pla

Cada homem “completo” é como um poço cujas águas vivas são os elementos inesgotáveis que conformam a alma, que fluem incessantes e regam o viver do homem. Se tais conteúdos são conscientes, se chamam alma (psyche), e se são inconscientes, vida (psyche também); mas em ambos os casos é a água figura testamentária da alma, e o poço é o lugar que a circunscreve e a alberga. No Cântico dos Cânticos, o noivo místico (o espírito), diz a noiva (a alma): Fonte dos hortos, poço de águas vivas! (Can 4,15)

Se diz que as águas do poço são vivas, porque o viver da alma — água vivificada — está feito da vida que em préstimo lhe dá o Espírito de Deus, o qual é o único vivente verdadeiro, o Vivente por si mesmo. Assim é como os mananciais insondáveis do Vivente vivificam as águas de todos e cada um dos poços, como um caudal torrencial que neles penetra e neles mora. A isso se refere Jesus no logion quando se lamenta de que ninguém está nos poços, em unidade com o Vivente, mas sim ao redor dos poços.

O verdadeiro sentido deste “dito” de Jesus é muito difícil de “realizar”, pois sua compreensão, que necessariamente há de ser “direta”, vivida, não depende por inteiro do entendimento, senão que chega como um “dom” que por si só abre à fé as portas da alma. Talvez por isso, e também porque tal como diz o logion não há ninguém nos poços, não se dirige Jesus aos que o escutam, senão ao Pai, ao Senhor, ao que pede que mantenha os fluxos de suas águas vivas para os poços para que estes, as almas, descubram seu próprio ser – ser real nos poços e não se percam em busca estéril fora de si mesmas.

Jesus fala do poço como figura da psyche, a mesma que emprega a tradição do AT, em uso paralelo no Gênesis de água como alma.

A versão mais esclarecedora desta “figura”, a oferece aquele poço no deserto, onde Agar, a escrava descobre por sua própria imagem nas águas, as primeiras perguntas que interrogam sobre o Ser: “de onde vens e a onde vais?” (Gn 16, 7-14).

Na hermenêutica praticada para a exposição do kerygma cristão, a alegoria do poço desenvolvida pela tradição veterotestamentária experimentou um deslocamento, que a fez menos mistérica, e em consequência, resultou mais acessível a captação de seu sentido genuíno. No NT, o fundo insondável do poço, o Eu Sou, é sem reservas, o Cristo oculto, interior, morador espiritual em todo homem.

Assim o explicita o quarto evangelho no capítulo no qual se relata o solitário encontro de Jesus com uma alma samaritana (Diálogo com a Samaritana). O centro geográfico que serve a esta cena é um suposto poço de Jacó não mencionado no Gênesis.