Pla
Jesus disse: A quem tenha em sua mão se o dará e a quem não, inclusive o pouco que tem o será tirado. [Parábola do Semeador; Parábola dos Talentos; Parábola das Minas]
Puech
41. Jésus a dit : Celui qui a dans sa main, on lui donnera, et, celui qui n’a pas, même le peu qu’il a, on le lui prendra.
Suarez
1 Jésus a dit : qui n’a pas, 2 à celui qui a dans sa main, 3 on donnera 4 et à celui 5 même le peu qu’il a, 6 on le prendra.
Meyer
(1) Jesus said, “Whoever has something in hand will be given more, (2) and whoever has nothing will be deprived of even the little that person has.”
Comentários
Roberto Pla
Refere-se uma vez mais ao mistério essencial da revelação evangélica, o do Cristo, “vivo”, interior, oculto (v. Cristo oculto), e esta essencialidade justifica que o mesmo logion apareça nos sinóticos em cinco ocasiões, com desígnios até certo ponto confluentes embora distintos. (vide também Logion 70)
Em seu sentido direto o logion aponta a sem razão, pouco ética, de tirar ao que não tem para dar ao que tem; mas sua explicação razoável somente é possível quando se entende o ali implicado com o verbo TER.
Quem tem o Filho tem a vida; quem não tem o Filho de Deus não tem a vida. (1Jo 5:12)
O Filho é sempre o Filho do homem, o Cristo vivente, oculto, ou também é, segundo as muitas denominações parabólicas evangélicas, a Palavra, a boa semente, a medida perfeita, a candeia que não deve ser oculta, o tesouro escondido, ou a pérola fina de grande valor.
Segundo a antropologia cristã em sua vertente oculta, o homem espiritual, o segundo Adão, espírito que dá vida, possui em propriedade essa joia superior, quer dizer, o talento, a mina única, o denário, no qual está impressa a marca de Deus e a imagem de si mesmo, pois à imagem de Deus foi feito o homem pneumático no sexto dia.
Em cada homem terreno, em cada homem completo de espírito, alma e corpo, esta imagem de Deus é a essência, o espírito, do qual se pode dizer de maneira figurada que inicia sua descida desde o alto em seguida ao matrimônio inefável com o Adão psíquico — as almas, as filhas dos homens — ao que vivifica e mercê a cujos esponsais, este recebe em usufruto a graça que o espírito possui em propriedade.
Nas parábolas evangélicas é sempre o homem psíquico o servo que recebe a mina, os denários ou os talentos, segundo sua capacidade. Os talentos encomendados aos servos, o são em medida de cinco, dois e um segundo a parábola em Mateus. As duas primeiras medidas (cinco e dois) estão em relação proporcional com as medidas dos frutos da palavra semeada, segundo a parábola raiz do semeador.
Em verdade, a mina ou o talento único o recebe ao nascer todo homem psíquico e esse é o “dinheiro” ou tesouro celestial de que dispõe, depositado no fundo de sua consciência, para despertá-lo pouco a pouco, trabalhosamente, até possuir em empréstimo a imagem impressa na moeda e que não é outra coisa que o Filho do homem, quer dizer, o Ser essencial, o si mesmo de cada homem.
Assim como a consciência do homem psíquico acede gradualmente ao reconhecimento de seu verdadeiro Ser, o espírito, por meio de um difícil processo de transfiguração. O Filho do homem é até então, até que se consumam suas bodas sagradas, o oculto, o grande desconhecido para a maioria da geração humana, e cada grau de despertar da consciência à luz do Filho do alto se reputa pelos evangelistas como TER, tal como se põe na boca de João Batista:
Aquele que crê no Filho tem a vida eterna; mas aquele que não crê no Filho não verá a vida, mas a ira de Deus sobre ele permanece. (Jo 3:36)
O QUE SE TEM OU SE RECEBE, encontra-se já uma primeira referência no evangelho de Mateus, e se inscreve quando Jesus justifica sua decisão de falar em parábolas. Segundo o que ali se diz, o semeado no coração — como essência — de cada homem é a Palavra, que quando se ouve e se entende dá fruto segundo sua medida. Mas dado que o fruto da Palavra consiste em TER vida eterna, não há dúvida de que o que TEM a Palavra em sua mão — como diz o logion em sua versão do Evangelho de Tomé — andará na eternidade e bem-aventurança; no entanto o que NÃO TEM, se afirma, por sua privação de fruto, na natureza transitória, mortal, do psíquico, terminará no nada da morte.
Este esquema o repete o Evangelho de Mateus na Parábola dos Talentos. Veja também a parábola da Candeia Acesa, onde o resultado final, o juízo, que vem de manter sob a cama a irradiação da Palavra, o descreve sutilmente Mateus na parábola do Mordomo Infiel.
A terceira referência ao logion a dá o evangelista Marcos dentro da parábola da medida.
A última referência do logion, em Lucas, se dá na Parabola das Minas. O que sempre vem a buscar e salvar o Filho do homem oculto são todos aqueles conteúdos psíquicos que uma vez voltados para a palavra por um ato de metanoia transcendente, “se purgam como a prata e se provam como o ouro” (Zacarias, 13,9).