Evangelho de Tomé – Logion 38

Pla

Jesus disse: Muitas vezes haveis desejado escutar estas palavras que os digo, e não tínheis a nenhum outro de quem ouvi-las. Dias virão nos quais me buscareis e não me encontrareis. [Retirar Esposo]; [Onde Vou]

Puech

38. Jésus a dit : Bien des fois vous avez désiré entendre ces paroles que je vous dis, et vous n’avez nul autre de qui les entendre. Des jours viendront où vous me chercherez et vous ne me trouverez pas.

Suarez

1 Jésus a dit : 2 bien des fois, vous avez désiré entendre ces paroles 3 que je vous dis 4 et vous n’en avez pas un autre 5 de qui les entendre. 6 Il y aura des jours 7 où vous me chercherez 8 et ne me trouverez pas.

Meyer

(1) Jesus said, “Often you have desired to hear these sayings that I am speaking to you, and you have no one else from whom to hear them. (2) There will be days when you will seek me and you will not find me.” [Cf. Matthew 13:17 (Q); Luke 10:24 (Q); 17:22; John 7:33–36; Proverbs 1:23–28]


Comentários

Roberto Pla

Falar de subir ou baixar, levantamento, elevação, etc…, significa sempre, desde o ângulo da vertente oculta, fazer uso de um jogo verbal metafórico, com o qual se intenta expressar uma “imersão” (outra metáfora adverbial) na matéria, ou uma desidentificação dela. Isto se deve ter bem presente pois do contrário o levantamento do Filho do homem, ou a subida ao Pai, as duas ações com mudança do lugar que agora ocupamos, se atêm uma única significação de ordem física, de vertente manifesta. para perceber sob a expressão superficial da linguagem o sentido interior da vertente oculta é necessário permanecer muito atento às armadilhas colocadas tradicionalmente pelas palavras e não cair nelas, pois como já se sabe, as palavras não são nunca outra coisa mais que um símbolo da coisa nomeada.

Para que o Filho do homem que “baixou do céu” possa de novo “subir ao céu”, explica Jesus que ante “tem que ser levantado o Filho do homem, e afirma que tal “levantamento” é necessário para crer (nesse Filho do homem, interior e essencial) e “assim ter a vida eterna”.

Para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. (Jo 3:15)

Quanto aos termos em que pode produzir-se este levantamento tão importante, são surpreendentes, pois o evangelho diz:

E como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado; (Jo 3:14) (vide Nascer do Alto)

É muito importante a semelhança que para efeito de levantamento do espírito que dá vida, estabelece aqui a escritura entre a serpente do relato mosaico e o Filho do homem. Convém recordar o texto veterotestamentário:

E disse o SENHOR a Moisés: Faze-te uma serpente ardente, e põe-na sobre uma haste; e será que viverá todo o que, tendo sido picado, olhar para ela. (Num 21:8)

A serpente de fogo (hebraico saraf), fabricada de bronze com a excepcional particularidade de dotar de vida eterna, verdadeira a todo o que a olhe uma vez levantada sobre a haste (a cruz); eis uma imagem, guardada em mistério, do levantamento do Filho do homem.

Não é possível deixar de relacionar a serpente ou dragão com boca de fogo levantado sobre um bastão por Moisés durante seu êxodo pelo deserto, com o Uraeus, ou serpente de fogo com qual se coroavam os faraós, pondo-a em sua fronte como uma figura de proa; segundo A. Champdor a figura simboliza o fluido vital, o hálito da vida, uma concentração de energia, vivificante, mas também capaz de matar.

Desde o anúncio de sua glorificação com a morte, diz Jesus: “E eu, quando for levantado da terra, todos atrairei a mim” (Jo 12:32) e tal coisa deve se interpretar desde a vertente oculta como a descrição pelo evangelho do ato sagrado pelo qual a consciência de Adão alma vivente “descobre”, por conta de descartar mortalmente os princípios aderidos do mundo, o Filho do Homem, até então ignorado por ela e agora desperto definitivamente à luz, “como quem ressuscitou da morte à vida” (Rm 6,13).

A mordida da serpente terrena como preparação para a vida eterna de quem veja o Filho do homem levantado no bastão, tem uma significação na escritura tão mítica como a aquisição do conhecimento suscitado nos primeiros padres edênicos pela serpente da árvore. O Filho do homem, recém-nascido à contemplação interior, é posto no mastro elevado da cruz, talvez na altura dos olhos que veem, para, uma vez ali, “levantado”, com concentrada fixação, até que um dia seja de súbito “traspassado” sutilmente e então o dois seja convertido em um, segundo está dito.

E eu lhes dei a glória que a mim me deste, para que sejam um, como nós somos um; eu neles, e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade, a fim de que o mundo conheça que tu me enviaste, e que os amaste a eles, assim como me amaste a mim. (Jo 17:22-23)

Com isso se cumpre o Oráculo de YHWH mencionado por Zacarias, “para formar o espirito do homem em seus interior” (Zac 12,1), e recordado segundo a vertente oculta pelo evangelho joanico, na ocasião da lança “manifesta” do soldado.

Também há outra escritura que diz: Olharão para aquele que traspassaram. (Jo 19:37)

O olhar permanente à Serpente permite que flua dela o fogo do conhecimento, pois está dito: “Deus é um fogo devorador” (Dt 4,24), um fogo cuja ação é salvar o grão e queimar a palha.

Quando da teofania no Sinai, Deus permitiu a Moisés e Arão subir ao monte, mas os sacerdotes e o povo, talvez com a alma carregada de palha, não traspassaram as bordas deste monte do espírito, pois, como eles disseram: “não aconteça que morramos” (Ex 19,24; 20, 19). Com efeito, para traspassar a Serpente e chegar onde vai o Filho do homem há que queimar antes a palha, tem que morrer a palha, pois não é ela a que sobe, senão o “nascido de cima”.