Evangelho de Tomé – Logion 113

Pla

Seus discípulos lhe disseram: O Reino, que dia virá? Jesus disse: Não virá com uma espera. Não se dirá: Já está aqui, ou já está ali, mas o Reino do Pai está espalhado sobre a terra e os homens não o veem.

Puech

Suarez

Meyer

Canônicos


Roberto Pla

A expectativa da Vinda a explica o logion em sua justa vertente oculta, profunda. O Reino é infinito e eterno, e não pode vir, senão por des-encobrimento, porque já é/está; não pode chegar, porque não há lugar não ocupado por ele desde antes do começo dos tempos. Dizer do Reino, do Filho do homem, o qual é o Reino, que vem ou que não chegou é uma figura de linguagem, como dizer que o Sol se levanta ou se põe.

O espírito do homem “é” do Reino de Deus, e o que denominamos a Vinda do Reino a nós, a Vinda que a cristandade espera, é em verdade a abertura da consciência à luz do Filho do homem, essa Luz que é conhecimento e vida, e que em essência somos sempre ainda que sem sabê-lo. No terceiro evangelho se explica isto muito bem: “O Reino de Deus vem sem se deixar sentir. E não dirão: veja-o aqui ou lá, porque o Reino de Deus está entre nós” (Lc 17, 20-21).

A salvação do homem, significada pela Vinda, pela manifestação do Reino de Deus na alma, é um acontecimento decisivo na vida de cada homem, mas é um ato íntimo, pessoal, não intercambiável, que tem que ver com o silêncio absoluto da alma e com a redenção do espírito; sem relação com as catástrofes cósmicas ou com o fim do mundo, menos ainda com a destruição do templo, ainda que este seja o de Jerusalém.

No entanto, os relatos dos sinópticos e com eles de toda a tradição eclesial, entenderam, segundo o parecer “manifesto”, que existe uma dependência mútua entre coisas tão díspares e heterogêneas como são o des-encobrimento de Deus na alma e a dissolução do mundo por efeito de um fogo celeste.

Se pode dizer que o discurso escatológico relatado no capítulo 13 de Marcos, e com poucas variantes, no capítulo 24 de Mateus, parece querer conjugar, por razões não compreensíveis, as místicas bodas da alma com a caída dos astros e as estrelas, e com uma espécie de loucura coletiva dos seres humanos, convertidos de improviso muitos deles em loucos assassinos e trânsfugas.

É certo que para achar o Ser de Deus é necessário que todo homem se ofereça em holocausto e consinta no sacrifício de seu próprio ser, do si mesmo psíquico; mas tal como se conta do ancião Abraão, quando não se negam a mão nem a faca para amolação aí está, bem próxima, a bem-aventurança. O sacrifício do homem não sempre é a morte; o que necessita em todos os casos é a transformação e esta, já se sabe, vem pela negação da alma com a cruz sobre os ombros.

É a transformação do homem o que traz a liberdade ao espírito cativo, essa liberdade para todos que foi o fim perseguido por Jesus ao proclamar a Boa Nova. A explicação do que há de fazer e não fazer para culminar nessa transformação que é liberdade e consumação, forma o corpo doutrinal do Evangelho, o qual é sempre um ensinamento; mas o capítulo da Vinda, o relato da descida do Espírito na consciência do homem, não pretende ser uma parênese senão até tudo uma descrição geral dos acontecimentos próprios de uma teofania.

Os evangelistas Marcos e Mateus não foram, seguramente, uma exceção em experimentar a condição inapreensível do acontecimento que tentavam descrever, e no capítulo da Vinda do Filho do Homem seguiram a norma de seus antecessores Moisés, Elias, Ezequiel, Daniel e carregaram as tintas hermenêuticas do lado da vertente oculta.

Por tudo isso não deve surpreender que os exegetas modernos da vertente manifesta encontrem normalmente diáfanos e claros os textos que estudam. No entanto, quando eles tropeçam em um texto e os parece notoriamente obscuro, tal como ocorre com o capítulo 13 de Marcos e o 24 de Mateus, é porque sua exegese só é possível desde a vertente oculta, a ciência hermenêutica que eles não praticam.

Essa ciência é por sua vez o fundamento deste nosso escrito. Como a descrição da Vinda do Filho do Homem é de uma importância singular porque é uma tentativa de descrever, embora por via oculta, a Paixão e a ressurreição de todo homem que aspira a lograr seu fim, seu telos, no mundo, haverá de submeter este relato a um trabalho exegético algo minucioso.

Para este trabalho tomaremos como base o capítulo 13 de Marcos, construído por seu autor como um todo, sem prejuízo de consignar quando faça falta, as variantes dadas por Mateus 24 e pelo curto fragmento de Lucas 21, sempre que ditas variantes aportam algum signo novo de interesse.

Suarez

Gillabert

Puech