Aqueles que dizem que o Senhor primeiro morreu,
e depois ressuscitou, estão errados;
pois ele primeiro ressuscitou e depois morreu.
Se alguém não tiver sido ressuscitado primeiro, só poderá morrer.
Se já tiver sido ressuscitado, ele está vivo, como Deus está vivo. [Evangelho de Felipe, 21]
Isso nos lembra que a ressurreição (Anastasis, em grego) não é um tipo de reanimação. Como o apóstolo Paulo mencionou claramente em sua carta aos Coríntios: “A carne e o sangue não podem herdar o Reino de Deus.” [1 Cor 15:50]
O Evangelho de Filipe nos convida a seguir Cristo despertando nesta vida para aquilo em nós que não morre, para o que São João chamou de Vida eterna. Essa vida não é a “vida após a morte”, mas a dimensão da eternidade que habita em nossa vida mortal. Somos chamados a despertar para essa Vida antes de morrermos, assim como Cristo fez.
O apóstolo Paulo ressalta ainda que não é o nosso corpo biológico-psíquico que ressuscita, mas o nosso corpo espiritual, ou pneuma em grego.1
O que é esse chamado corpo espiritual? Ele não está já tecido nesta vida, a partir de nossos atos de generosidade e da doação de nós mesmos? Pois a única coisa que a morte não pode nos tirar é o que doamos. O Evangelho de Felipe enfatiza esse poder de doação, essa capacidade de oferecer que o soter (em grego, “salvador”) veio liberar em nós. É esse “corpo dado em oferta” que é nosso corpo de glória, nosso ser ressuscitado.
Não foi somente no momento de sua manifestação
que ele fez uma oferta de sua vida,
mas desde o início do mundo, ele deu sua vida em oferta.
Na hora de seu desejo,
Ele veio para libertar essa oferta mantida em cativeiro.
Ela havia sido aprisionada por aqueles que roubam a vida para si mesmos.
Ele revelou os poderes do Dom
e trouxe bondade ao coração dos iníquos. [Evangelho de Felipe, Philip, 9:5–11]
Como nos outros Evangelhos, encontramos essa metafísica do Dom, ou agape, que reside no próprio coração do Ser e que o Mestre revela por meio de suas palavras e atos.
Cf. 1 Cor 15 sobre o tema da ressurreição. [É importante observar que o autor usa as palavras alma e espírito com base em seus significados originais, que são significativamente diferentes de seus usos modernos. Na antiguidade, a psique grega, que significa alma, não tinha o mesmo status elevado que a alma assumiu no cristianismo posterior, nem era confundida com espírito (pneuma em grego), como veio a ser mais tarde e ainda é no uso atual. Para os antigos, a alma incluía aspectos do corpo mortal, da mente e das emoções, bem como algo do espírito que os transcendia. Era uma realidade intermediária entre o físico e o espiritual. Em um refinamento adicional dessa intermediação, o noûs aparece aqui como aquele “ponto fino” da psique (alma) que está mais próximo do pneuma (espírito). — Trad.] ↩