ESCOTO ERIUGENA — HOMÍLIA SOBRE O PRÓLOGO DO EVANGELHO DE SÃO JOÃO
XVII A VERDADEIRA LUZ (Jo I,9)
Essa era a verdadeira Luz, que brilha em todo homem que vem ao mundo.
O que “vem ao mundo” significa? O que devemos entender por “todo homem que vem ao mundo”?
E se esses significam aqueles que vem ao mundo das dobras ocultas da natureza através da geração em tempos e lugares, então que espécie de iluminação é possível para eles nesta vida onde nascemos mas para morrer, crescemos mas para decrescer, coagulamos mas para ser dissolvidos de novo, caindo do repouso da natureza silenciosa na agitação da miséria barulhenta? Diga-me, por favor, que espécie de luz espiritual e verdadeira há para esses procriados em uma vida transitória e falsa? Não é precisamente este mundo uma morada adequada para aqueles alienados da verdadeira luz? Não é ele justamente chamado a região da sombra da morte, o vale das lágrimas, o abismo da ignorância, a habitação terrestre que pesa sobre a alma humana e expele a verdadeira visão da luz pelos olhos interiores?
A frase “que brilha em todo homem que vem ao mundo” não pode portanto se referir àqueles que procedem de causas seminais ocultas para espécies corporais. Ao invés deve se referir àqueles que, pela regeneração espiritual através da graça que é dada no batismo, entram o mundo invisível. Rejeitando o nascimento de acordo com o corpo corruptível, estes escolheram o segundo nascimento, que é espiritual. Eles trilham oprimidos o mundo que está abaixo e ascendem ao mundo que está acima, deixando para trás as sombras da ignorância e da morte, eles anseiam pela luz da sabedoria e da vida. Deixando de ser filhos de seres humanos e começando a ser filhos de Deus, eles deixam para trás deles o mundo dos vícios, destruindo estes em neles mesmo, sustentando diante de seus olhos mentais o mundo das virtudes, aspirando com toda sua força lá ascender. Assim a verdadeira luz ilumina aquele que entra neste mundo de virtude, não aqueles que escapam para o mundo dos vícios.