ESCOTO ERIUGENA — ANÁLISE DO TRATADO «DA DIVISÃO DA NATUREZA».
Nicola Abbagnano — História da Filosofia
A LÓGICA
De acordo com a orientação platonizante do sistema, a lógica de Escoto Erígena é realista: pressupõe a realidade objetiva de todas as determinações lógicas universais, de todos os conceitos de gênero e espécie. Está no espírito de uma lógica que quanto mais um conceito é universal, tanto maior é a sua realidade objetiva; assim os conceitos dos gêneros supremos são mais reais que os dos gêneros menos extensos; e os conceitos de gênero são mais reais que os conceitos de espécie, nos quais todo o gênero se subdivide; enfim, as espécies especialíssimas, isto é, os indivíduos, têm uma realidade menor que as espécies superiores ou mais extensas. Comentando uma passagem bíblica, Escoto afirma que Deus criou primeiro o gênero, porque nele se contêm e estão reunidas todas as espécies; o gênero divide-se em seguida e multiplica-se nas formas gerais e nas espécies especialíssimas. Daqui pode tirar-se uma conclusão fundamental sobre o valor objetivo da dialética: «A arte que divide os gêneros em espécies e resolve as espécies e os gêneros, a chamada dialética, não foi criada através das investigações humanas, mas baseia-se na própria natureza e foi criada pelo Autor de todas as artes que são verdadeiramente artes, descoberta pelos sábios e empregada para proveito de toda a classe de investigações sobre as coisas.» (IV, 4)). E assim a tábua lógica dos conceitos dispostos segundo a ordem da sua universalidade, identifica-se, segundo Escoto, com a ordem metafísica das determinações do ser.
A mais universal determinação lógica, e por conseguinte, a mais real determinação objetiva, é a essência (ousia), que é incorpórea, simples e indivisível. A essência existe nos gêneros e nas espécies, mas não se divide neles, permanecendo não-multiplicada, mesmo que se multiplique nos gêneros, nas espécies e nos indivíduos (I, 34). «A essência subsiste toda reunida, está eterna e imutavelmente nas suas subdivisões, e todas as suas subdivisões constituem simultaneamente e sempre, nela, uma unidade inseparável» (I, 49). Por isso, a essência de todas as coisas é na realidade uma só, é o próprio Deus (I, 1). É incognoscível e incompreensível como o próprio Deus; o que se percebe com os sentidos ou se compreende com o inteleto em toda a criatura, é apenas algum acidente da essência incompreensível (I, 3).
A lógica de Escoto, que nasceu dois séculos antes de a discussão sobre os universais se transformar no problema fundamental da dialética, apresenta antecipadamente a solução tipicamente realista do problema e é a fonte de todas as soluções do mesmo tipo que foram adotadas depois. Representa também o papel de um termo de comparação polêmico para as escolas anti-realistas.