Saint-Martin (SMTN, II) – Ser
Este é o lugar para observar os resultados de todas as pesquisas que foram feitas sobre Deus e sobre a matéria. Em todos os tempos, procurou-se saber o que é a matéria, e ainda não se conseguiu concebê-la: há até línguas muito eruditas que não têm palavras para expressá-la. Pelo contrário, entre aqueles que tomaram Deus como objeto de suas reflexões, nenhum foi capaz de dizer o que Ele não era; pois não há denominações positivas, expressando um atributo real ou uma perfeição, que não sejam adequadas a esse Ser universal, uma vez que Ele é a base primeira de tudo o que existe. E se os homens às vezes lhe dão denominações negativas, tais como Imortal, Infinito, Independente, veremos, examinando seu verdadeiro sentido, que elas expressam atributos muito positivos, pois, na verdade, essas denominações servem apenas para anunciar que ele está isento das sujeições e dos limites da matéria. Quadro natural…: II
O Ser criador produz incessantemente seres fora de si, assim como os princípios dos corpos produzem incessantemente fora de si a sua ação. Quadro natural…: II
Ele não produz conjuntos, pois é UM, simples em sua essência. Consequentemente, se, entre as produções desse primeiro Princípio, há algumas que podem se corromper, elas não podem, pelo menos, se dissolver ou se aniquilar, como as produções corporais e compostas. Já aí está uma grande diferença quanto à natureza desses dois tipos de Ser. Encontraremos uma diferença ainda maior no tipo de corrupção a que estão sujeitos. Quadro natural…: II
Há observadores que, considerando o homem apenas em seu estado natural de degradação, escravo de preconceitos e hábitos, dominado por suas inclinações, entregue às impressões sensíveis, concluíram que ele era igualmente necessário em todas as suas ações intelectuais ou animais, de onde se sentiram autorizados a dizer que o mal provém dele mesmo, ou da imperfeição de sua essência, ou de Deus, ou da Natureza, de modo que seus atos em si mesmos seriam indiferentes. Aplicando então a todos os Seres a falsa opinião que formaram sobre a liberdade do homem, negaram a existência de qualquer Ser livre, e de seu sistema resulta que o mal existe essencialmente. Quadro natural…: II
Sem nos determos em combater esses erros, bastará observar que eles provêm apenas da confusão entre os atos do Ser livre, os motivos, a determinação e o objeto: ora, reconhecendo que o princípio do mal só pôde empregar sua liberdade sobre um objeto qualquer, não seria menos certo queele fosse o autor do motivo de sua determinação; pois o objeto ou o sujeito sobre o qual exercemos nossa determinação pode ser verdadeiro, e nossos motivos não; todos os dias, em relação às melhores coisas, formamos motivos falsos e corruptos; não se deve, portanto, confundir o objeto com o motivo; um é externo, o outro nasce em nós. Quadro natural…: II
Essas observações nos levam a descobrir a verdadeira fonte do mal. De fato, um Ser que se aproxima e desfruta da visão das Virtudes do Princípio soberano pode encontrar nisso um motivo preponderante oposto às delícias desse espetáculo sublime? Se ele desviar os olhos desse grande objeto, ou se, voltando-os para essas produções puras do infinito, ele procurar, contemplando-as, um motivo falso e contrário às suas leis, pode encontrá-lo fora de si mesmo, uma vez que esse motivo é o mal, e que esse mal não existia em lugar algum para ele antes que esse pensamento criminoso o tivesse feito nascer, assim como nenhuma produção existe antes do seu Princípio gerador. Quadro natural…: II
Eis como o estado primitivo, simples e puro de todo Ser intelectual e livre, prova que a corrupção não pode nascer nele mesmo, sem que ele próprio produza voluntariamente o germe e a fonte. Eis como fica claro que o Princípio divino não contribui em nada para o mal e a desordem que podem nascer entre suas produções, uma vez que ele é a própria pureza. Eis, finalmente, como ele não participa disso: uma vez que, sendo simples como suas produções e, além disso, sendo ele próprio a lei de sua própria essência e de todas as suas obras, ele é, com maior razão, impassível como elas, a toda ação estranha. Quadro natural…: II
Tal é o verdadeiro quadro do que se passa na ordem imaterial, embora os Seres livres, distintos do grande Princípio, possam afastar as influências intelectuais que continuamente descem sobre eles; embora essas influências intelectuais recebam talvez, no seu curso, alguma contração que desvie os seus efeitos, aquele que lhes envia esses presentes salutares nunca fecha a sua mão benéfica. Ele tem sempre a mesma atividade. Ele é sempre igualmente forte, igualmente poderoso, igualmente puro, igualmente impassível diante dos desvios de suas produções livres, que podem mergulhar por si mesmas no crime e gerar o mal pelo único direito de sua vontade. Seria, portanto, absurdo admitir qualquer participação do Ser divino nas desordens dos Seres livres e naquelas que delas resultam no Universo; em suma, Deus e o mal nunca podem ter a menor relação. Quadro natural…: II
Ora, se existem apenas três classes de seres: Deus, os seres intelectuais e a natureza física; se não se pode encontrar a origem do mal na primeira, que é exclusivamente a fonte de todo o bem, nem na última, que não é livre nem pensante; e se, no entanto, a existência do mal é incontestável, somos necessariamente forçados a atribuí-la ao homem ou a qualquer outro ser que, como ele, ocupe um lugar intermediário. Quadro natural…: II
Já indicamos suficientemente como o homem poderia ter-se convencido da existência imaterial do seu Ser e da do Princípio supremo, e o que deveria observar para não confundir esse Princípio com a matéria e a corrupção, nem atribuir às coisas visíveis essa Vida imperecível, que é o mais belo privilégio do Ser que não teve começo e ao qual apenas suas produções imediatas participam pelo direito de sua origem. Quadro natural…: II
