Faivre (AFPN) – Oetinger, a alma é um fogo
AFPN
Graças à eletricidade e à irritabilidade, somos capazes de compreender que a mente racional, a alma elétrica e o corpo são coisas diferentes. A cobiça dos olhos ou da carne, o orgulho, a raiva são manifestações ácidas, amargas, sulfurosas do fogo elétrico, explica Œtinger em uma passagem surpreendente que decidi apresentar aqui por seu interesse antropológico e seu aspecto fantástico (cf. infra, “Textos”). Espírito, alma e corpo não são justapostos como queria a teoria da harmonia pré-estabelecida, mas entrelaçados uns nos outros. Esse corpo sutil que é o espírito vital, o pneuma, para Aristóteles, Divisch chama de “alma elétrica” (p. 166 s). O verdadeiro espírito é distinto disso. Œtinger também considera a alma humana como estratificada, hierarquizada, folheada, e nisso se une aos defensores da antropologia esotérica tradicional, ao mesmo tempo em que antecipa evidentemente as descobertas da psicanálise. Em desacordo com a monadologia leibniziana, segundo a qual uma mônada é um punctum indivisibile, ele considera a alma, elemento dessa hierarquia, como ela própria complexa. Em seu Dictionnaire biblique et emblématique (artigo “Seele”, alma), ele explica isso da seguinte maneira: É um conjunto de diferentes energias e essências, que no início são rudes, ígneas e voláteis, mas que no seu processo de evolução se tornam suaves, amáveis e fixas. As monadas devem nascer instantaneamente, mas a alma nasce em momentos sucessivos. Seu ponto final ou terminus ad quem é uma substância pura, corporal e espiritual (geist-leiblich) A alma é um fogo que corre dentro de si mesmo em um sentido giratório e que cresce sob a ação da luz superior do Verbo De acordo com toda a analogia da Escritura, a alma é um fogo João Batista diz que Jesus nos batizará com o Espírito Santo e com o Fogo: trata-se de algo que se acrescenta à alma. O Espírito Santo, na medida em que batiza a alma com fogo, é um fogo santo e verdadeiro; e a alma deve elevar esse fogo da alma a um estado superior; caso contrário, não haveria relação entre a alma e o fogo do Espírito a alma é realmente um fogo que não se consome, cf. Ezequiel 1, 1063.
Oetinger então se dedica a diversas considerações sobre a noção de corpo e espírito em Aristóteles e Platão, para concluir lembrando que é somente em Cristo que a filosofia acabará por encontrar sua verdadeira forma; todos os sistemas se fundirão então em uma única sympatheia, que deverá muito às ciências. Tudo será compreendido como convém, pois não há nada oculto que não deva um dia ser revelado (p. 168). Oetinger termina com uma profissão de fé que se apresenta como justificativa. Por que, pergunta ele, o teólogo que ele próprio é estuda a química e a alquimia? Porque a Bíblia não apresenta apenas alegorias, mas inúmeros emblemas retirados das criaturas e da natureza das coisas. Oetinger lembra que publica, nesse mesmo ano de 1765, Theologia ex idea vitae deducta; portanto, considera pouco surpreendente que se interesse por uma “theologia emblematica”; sem uma química superior, ninguém pode explicar os emblemas das Escrituras. As verdadeiras perspectivas agora abertas à “física das Escrituras” não se baseiam nas leis do movimento, nem em teoremas mecânicos, aerométricos, hidrostáticos… mas na observação de fenômenos acessíveis a todos, tais como o nascimento dos animais, dos vegetais e dos minerais, ou a purificação dos sais. O objetivo da natureza é o sal regenerado (p. 169-170).
