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Deghaye (CHJB) – Vontade de Deus em Boehme

CHJB

A teologia tradicional também trata de Deus como sujeito. Deus é o sujeito de seus atos. Ele se determina segundo sua vontade. Deus é vontade. Falou-se do voluntarismo de Böhme. Certamente, a vontade de Deus é um conceito primordial de sua teosofia. No entanto, ela é bem diferente daquela tradicionalmente atribuída a Deus.

De acordo com as teologias dogmáticas, Deus quer ser ele mesmo. O mesmo acontece com Böhme. Como poderia Deus querer algo que não fosse ele, uma vez que ele é tudo? Mas, de acordo com as concepções tradicionais, a perfeição de Deus implica uma identidade absoluta entre o sujeito e o objeto de sua vontade: Deus é um. Essa identidade faz com que Deus repouse em si mesmo no ato puro de sua vontade. Não há em Deus a tensão do desejo que é próprio da criatura imperfeita e que só se acalma quando a vontade se renuncia. Ora, no ciclo septenário de Böhme, o repouso de Deus só aparece no sétimo grau, como no sétimo dia da Gênese.

Nos dois primeiros graus, a vontade divina se traduz primeiro por um desejo que se endurece ao extremo, por não poder relaxar ao apreender outra coisa que não sua própria sombra. Em seguida, ela se manifesta como um aguilhão furioso, que é esse primeiro desejo voltado contra si mesmo e buscando libertar-se de seu próprio abraço, abrir uma brecha em sua própria espessura. O resultado, no terceiro grau ou forma, é um turbilhão terrível no qual as duas forças antagônicas, a primeira tendendo para baixo, a segunda para as alturas, lutam sem que uma prevaleça sobre a outra. Esta terceira forma simboliza o terror do desejo sob o nome de angústia.

Reconheçamos que esses curiosos avatares da vontade divina tinham o que fazer tremer os teólogos acostumados a celebrar a paz em Deus. Certamente, a vontade se relaxa na fase posterior do ciclo septenário, mas isso tem o preço de uma peripécia que se assemelha muito à conversão do pecador moribundo à sua própria vontade para nascer à vida verdadeira.

De acordo com as teologias cristãs que chamamos de tradicionais, no sentido mais amplo do termo, Deus sujeito não é apenas vontade, mas também um pensamento em ação. Deus conhece a si mesmo e, desde o início, seu conhecimento é perfeito. Não se pode dizer o mesmo do Deus de Böhme, se o considerarmos na manifestação do ciclo septenário. A inteligência divina (Verstand) só é simbolizada no sexto grau, após o advento da luz. Além disso, é pelo fato da dor, simbolizada pela angústia no terceiro nível, que Deus toma consciência de si mesmo. O Deus bem-aventurado que repousa no ato puro de sua vontade e inteligência torna-se, em Böhme, o Deus doloroso que só se encontra depois de ter se procurado.

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