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Bem e Belo (COP)
//Henri Crouzel – Orígenes e Plotino (COP)//
Capítulo I: Pai em Orígenes e Uno em Plotino
PLOTINO
O Belo deve ser distinguido do Bem que está além do Belo. Este último está no Inteligível, lugar das ideias, mas o Bem é a fonte e o princípio do Belo. Em outras palavras, o Belo está na segunda hipóstase e o Bem na primeira: a segunda hipóstase é ao mesmo tempo inteligência e inteligível, sujeito e objeto de pensamento. O contemplativo foge das belezas do corpo e vai para as da alma. A beleza que está nos corpos é-lhes acrescentada: ela vem das formas (morphai) que informam a matéria. E ela pode mudar: o feio pode suceder ao belo. A presença da beleza torna o corpo belo, mas é sobretudo a da alma que moldou o corpo e lhe deu sua forma (morphe). Esta beleza, a alma a possui por si mesma? Não. Há almas feias. A alma é tornada bela pela phronesis. Esta palavra que designa a prudência na enumeração das quatro virtudes cardeais deve ter aqui um sentido mais amplo e designar a sabedoria em geral. Ela se confunde com a segunda hipóstase, a Inteligência, e ela é bela por si mesma. Mas é preciso ir além dela, pois se ela é para nós a primeira, ela constitui apenas o vestíbulo do Bem, ela anuncia nele todas as coisas: por causa da multiplicidade do inteligível na Inteligência, ela é uma impressão do Bem no múltiplo. A ideia do Belo está ligada à de forma (morphe, eidos), formas que constituem o inteligível que é o objeto da Inteligência, mas não há forma no Um-Bem: “O que está antes dele (antes do Belo) não quer ser belo, mas o que se presta primeiro à contemplação porque é forma (eidos) ou objeto de contemplação (theama) da Inteligência, é isso que é amado quando o vemos”.
“O amor do Belo, quando ele está lá, dá dores, pois é preciso que aqueles que o veem o desejem. Este amor é segundo e para aqueles que já compreendem mais isso significa que o Belo é segundo. Mas o desejo do Bem, mais antigo que este e não sensível, diz que o Bem é mais antigo e primeiro em relação ao Belo. E todos pensam quando se recebeu o Bem que ele é suficiente: chegamos ao seu fim… O Bem não precisa do Belo, mas o Belo precisa do Bem. O Bem é benevolente, prestável e gracioso e se alguém o quer, ele lhe é presente; o Belo tem o espanto, ele atinge e mistura à pena o prazer… O Belo é mais jovem, o Bem mais antigo, não pelo tempo, mas pela verdade, pois ele tem o poder anterior. Ele o tem por inteiro; o que vem depois dele não o tem por inteiro, mas tal como o tem um ser que está depois dele e que veio dele. De modo que o Bem é o mestre deste poder, ele não precisa do que nasceu dele, mas ele é por inteiro, deixando o que ele gerou porque ele não precisa de nada dele, e ele é o mesmo, tal como ele era antes de o gerar”. A relação do Bem com o Belo é, portanto, a do Um com a Inteligência: é, portanto, o Um-Bem que gera o Belo, é aquele que é sem forma que produz a forma. O Bem é o princípio da beleza.
O Um-Bem está também além das virtudes. Na descrição do êxtase que faz o último parágrafo da última Enéada, antes de chegar ao Um, o místico ultrapassa o que caracteriza a Inteligência, ou seja, o Belo e o coro das virtudes, como aquele que depois de ter penetrado no Templo, a Inteligência, se dirige para o santuário mais secreto, o aditon ou a cella, ultrapassando as estátuas que estão no Templo e representam as virtudes. Ele as encontrará ao sair, o êxtase terminado. No Tratado das virtudes, Plotino coloca as virtudes na alma, não na Inteligência, nem no que está além: há, no entanto, na Inteligência os paradigmas das virtudes. Se seria de fato desarrazoado atribuir a Deus as virtudes que Plotino chama políticas, ou seja, provavelmente sociais — são as quatro virtudes chamadas habitualmente cardeais —, pois elas supõem a presença de oposições, há, no entanto, em Deus algo que lhes corresponde: o que corresponde às virtudes em Deus é comparado ao fogo que aquece, na alma ao que é aquecido. Mas não é fácil ver o que designa nesta passagem a palavra Deus.
ORÍGENES
Não se encontra em Orígenes reflexão sobre o belo. A palavra kalos designa habitualmente o bem e no Peri Archon, tanto quanto se pode julgar pelos fragmentos da Filocalia, ele é traduzido por Rufino em bonus e aischros em malus. O termo kalos está ausente dos índices do Contra Celso: encontra-se, no entanto, alguns raros empregos do substantivo kallos com um sentido estético: a beleza das criaturas, a discussão sobre a beleza de Jesus, a beleza da linguagem grega. A palavra oraios é também muito rara nestes dois livros. Uma pesquisa no Comentário sobre João leva aos mesmos resultados: empregos raros destas palavras, sentido estético, corporal ou espiritual de kallos e de oraios, sentido moral ou de habilidade técnica de kalos. Orígenes não se interessa muito pela estética.
