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Ruysbroeck (JRNE) – Potências da alma

O ORNAMENTO DAS NÚPCIAS ESPIRITUAIS

Quando ela se torna fundamental, todas as virtudes crescem e todas as potências da alma recebem seu adorno; pois sob sua influência o homem está sempre com o espírito alegre, o coração despojado de preocupações, ardente em desejos e se doando comumente a todos em obras virtuosas. Por mais pobre que seja, de fato, se não ama as coisas terrestres, assemelha-se a Deus, sendo seu sentimento mais íntimo o de se espalhar e dar. E dessa maneira ele expulsa o quarto pecado capital, que é a avareza e a cupidez. Falando de tais homens Cristo diz: “Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia”, no dia em que ouvirem esta voz: “Vinde, benditos de meu Pai, possuí o reino que vos está preparado”, por causa de vossa misericórdia, “desde a fundação do mundo”… Livro I - A vida ativa: CAPÍTULO XIX

O mesmo zelo lhe dá a vigilância na razão e no discernimento, e o faz praticar as virtudes da alma e do corpo, em toda retidão. Sob o império desse zelo sobrenatural todas as potências da alma estão abertas a Deus e prontas a todas as virtudes. A consciência se regozija e a graça de Deus aumenta, a virtude é praticada com entusiasmo e alegria, e as obras exteriores recebem seu adorno. Livro I - A vida ativa: CAPÍTULO XX

O povo miúdo do reino, são todas as potências da alma, que devem ser estabelecidas na humildade e no temor de Deus, e serem submetidas a ele em todas as virtudes, cada uma segundo o que lhe é próprio. Livro I - A vida ativa: CAPÍTULO XXIV

Assim, quem quiser desfrutar do pleno resplendor do sol eterno, que é o próprio Cristo, deve ter os olhos abertos e habitar nos cumes, na parte alta, reunindo todas as suas potências e elevando a Deus um coração livre e desapegado das preocupações causadas pela alegria ou pela dor, e de toda criatura. Lá, nesse coração livre e elevado, resplandece Cristo, verdadeiro sol da justiça, e esses são os cumes de que quero falar. Cristo, de fato, sol glorioso e clareza divina, ilumina, banha com seus raios e incendeia pela sua vinda interior e pela virtude de seu Espírito, o coração livre e todas as potências da alma. E essa é a primeira obra dessa vinda interior na prática da vida afetiva. Como a virtude e a eficácia do fogo são de incendiar tudo o que é apto a queimar, assim Cristo incendeia com o ardor de sua vinda interior os corações livres e elevados que estão dispostos a isso, e nessa vinda ele diz: “Saí, praticando o que convém a esse modo de advento.” Livro II - A VIDA INTERIOR CAPÍTULO VIII

É da mesma maneira que opera o fogo interior do Espírito Santo. Ele excita, aquece e abala o coração com todas as potências da alma até a efervescência, que consiste em agradecer a Deus e louvá-lo, como demonstrei. Assim se desce até o fundo mesmo onde o Espírito de Deus faz sentir seu calor; de modo que o fogo do amor queima sempre e o coração do homem sobe incessantemente em ação de graças e em louvor que suas palavras e obras expressam, permanecendo sempre humilhado; e assim se estima muito o que haveria para fazer e que se realizaria de bom grado, e muito pouco o que se faz na realidade. Livro II - A VIDA INTERIOR CAPÍTULO XV

Ora, nesse modo, a primeira obra de Cristo é fazer subir ao céu o coração, o desejo e todas as potências da alma, e chamar à união com ele. Assim, ele diz espiritualmente no coração: “Saí de si mesmo para vir a mim, seguindo a atração e o convite que são oferecidos.” Essa atração e esse convite, dificilmente consigo explicá-los a pessoas vulgares e sem delicadeza: mas é um chamado e um convite dirigidos ao íntimo do coração para a alta unidade de Deus. Esse chamado íntimo é mais doce ao coração amante do que tudo o que pôde provar antes, e faz nascer um modo novo e um exercício mais elevado. Livro II - A VIDA INTERIOR CAPÍTULO XXII

Então o coração se expande de alegria e desejo, todas as veias se dilatam, cada uma das potências da alma se sente pronta e quer responder ao que é exigido por Deus e pela união com ele. Esse convite é como uma irradiação do sol eterno, que é o Cristo; ele dá ao coração delícias e alegria tão grandes, e o faz expandir-se tão largamente que dificilmente pode fechar-se. O homem é ferido no coração e sente uma chaga de amor. Ora, ser ferido de amor é o sentimento mais doce e também a dor mais pungente que se pode suportar. Mas ser ferido de amor é um sinal certo de que se curará. A ferida espiritual dá alegria e dor ao mesmo tempo. E nesse coração com a ferida aberta, Cristo, sol da verdade, derrama novamente e espalha sua luz, e reclama sempre que se una a ele. Por isso a ferida e as chagas se renovam. Livro II - A VIDA INTERIOR CAPÍTULO XXII

Precisamos falar agora de uma segunda vinda de Cristo na vida interior, pela qual o homem é adornado, iluminado e enriquecido segundo as três potências superiores da alma. E essa vinda pode ser comparada a uma fonte viva que se derrama em três riachos. Essa fonte, com os riachos que dela correm, é a plenitude da graça de Deus na unidade de nosso espírito. A graça, de fato, permanece ali essencialmente como em seu assento, semelhante a uma fonte toda cheia, e ali é ativa na medida em que jorra em riachos em cada uma das potências da alma, segundo o que lhes é útil. Esses riachos são influxos particulares ou ações íntimas de Deus nas potências superiores, onde ele age de muitas maneiras por meio de sua graça. Livro II - A VIDA INTERIOR CAPÍTULO XXXV

O primeiro riacho de graça que Deus faz correr nessa segunda vinda é uma pura simplicidade que brilha no espírito sem distinção. Esse riacho parte da fonte que está na unidade do espírito e desce em linha reta, penetrando todas as potências da alma, as mais altas e as mais humildes, e as elevando acima de toda multiplicidade e ocupação. Ele cria no homem a simplicidade, e lhe descobre e lhe dá um laço interior que o prende à unidade de seu espírito. Dessa forma o homem é elevado segundo a memória, e desapegado de toda incursão de pensamentos estranhos e de instabilidade. Livro II - A VIDA INTERIOR CAPÍTULO XXXVI

Quando o homem considera assim essa riqueza admirável e essa sublimidade da natureza divina, assim como todos os dons múltiplos espalhados sobre as criaturas, ele sente crescer interiormente sua admiração pela riqueza tão variada, a elevação e a fidelidade sem fim que Deus demonstra para com o que ele criou. Daí nascem uma singular alegria interior e um imenso abandono a Deus, e essa alegria íntima abraça e penetra todas as potências da alma e o mais profundo do espírito. Livro II - A VIDA INTERIOR CAPÍTULO XXXVIII

A alegria de que acabamos de falar, a plenitude da graça e a fidelidade divina fazem jorrar e correr o terceiro riacho na mesma unidade do espírito. Esse riacho, semelhante ao fogo, inflama a vontade, devora e consome todas as coisas em unidade, inunda e penetra todas as potências da alma com ricos dons e nobreza singular, e ele cria na vontade um amor espiritual sem trabalho, de grande delicadeza. Livro II - A VIDA INTERIOR CAPÍTULO XXXIX

Na unidade de que falamos, nosso espírito pode ser considerado sob um segundo aspecto, o de sua atividade, e ele subsiste em si como em seu ser criado pessoal. Esse é o fundo original das potências superiores, fonte e termo de toda operação de criatura, isto é, realizada segundo o modo das criaturas, tanto na ordem natural quanto na ordem sobrenatural. No entanto, a unidade não opera como unidade; mas todas as potências da alma, de qualquer maneira que ajam, tiram toda a sua virtude e todo o seu poder de seu fundo próprio, que é a unidade do espírito, em seu ser subsistente e pessoal. Livro II - A VIDA INTERIOR CAPÍTULO LVIII

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