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Merejkovsky – Jesus Desconhecido (II.9)
Dmitri Merejkovsky – Jesus Desconhecido. Tr Gustavo Barroso. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1935
**PARTE DOIS**
**VIDA DE JESUS DESCONHECIDO**
**IX. SEU SEMBLANTE (na história)**
I
“Que eu veja somente seu rosto e serei salvo”, dizia consigo, sem dúvida, o publicano Zaqueu, subindo ao sicômoro; subiu, viu e foi salvo. Talvez nos salvássemos também, se víssemos seu semblante. Mas é muito difícil. Porque esse rosto estranho parece com o livro em que se reflete como num espelho: esse livro, embora muito lido, é como se nunca se pudesse acabar de ler, como se alguma coisa ficasse esquecida ou mal entendida; relê-se e volta a mesma impressão; assim, infindavelmente. Dá-se o mesmo com seu semblante: não se pode vê-lo completamente; por mais que se contemple, parece sempre que houve qualquer traço que não foi notado ou que não se compreendeu inteiramente. Há dois mil anos que milhões de olhos humanos o olham sem vê-lo e continuarão a olhá-lo sem vê-lo até a consumação dos séculos.
II
“A imagem carnal de Jesus nos é desconhecida”, declara, desde fins do século II, Santo Irineu de Lião, referindo, assim, uma tradição que remontava provavelmente aos homens apostólicos, a Policarpo e ao presbítero João de Éfeso, talvez mesmo a João, filho de Zebedeu, “o discípulo amado de Jesus (1)”. “Ignoramos completamente como era seu semblante”, afirma do mesmo modo Santo Agostinho e acrescenta: “a face do Senhor muda com a diversidade dos inúmeros pensamentos (2) A mudança virá só de nossos pensamentos ou do que há nesse próprio rosto? Santo Antonino Mártir, peregrino do século VI, conta no seu “Itinerário” que lhe fora impossível ver bem o semblante do Senhor numa imagem milagrosa, achiropoiete, deslumbrado pela luz maravilhosa que dela emanava e também porque esse “rosto mudava completamente diante dos que o contemplavam (3) ”. Se algo semelhante ocorre com o rosto vivo de Jesus, tal como o conhecemos pelos Evangelhos, Irineu e Agostinho se enganam: nós conhecemos ou poderíamos conhecer o semblante do Senhor.
III
Comprei, não sei mais onde nem quando, uma velha e péssima reprodução da imagem milagrosa do Senhor, que se achava na Catedral da Assunção, em Moscou, e que, segundo a tradição, imprimiu ele próprio no pano e enviou a Abgar, rei de Edessa. Durante anos, ela esteve pendurada numa parede de meu quarto, tanto que meus olhos, cegos pelo hábito, não a viam mais. Porém um dia em que, pensando no rosto do Homem Jesus, me aproximei dessa reprodução, vi de súbito e fiquei assombrado: “Senhor, retira-te de mim, porque eu sou um homem pecador”, O olhar dos olhos não humanos, que parecia vir do outro mundo, era ligeiramente oblíquo: minha alma se consumiria, se me olhasse de frente; ele me perdoa e espera que chegue a minha hora. Sobre a testa, até em cima da risca que divide a cabeleira de linhas ondulosas e paralelas, que se diriam traçadas a compasso com preocupação geométrica, sai uma mecha recalcitrante como as dos pequenos camponeses mal penteados, e os lábios, levemente entreabertos, os lábios de enternecedora puerilidade parecem murmurar: “Minha alma estava em mim como um filho roubado à sua mãe”. Como tudo isso é simples, infantil, tocante, ao lado do “Rei de terrível majestade”, Rex tremendae majestatis. Dois entes num só, discordantes e concordantes: eis o que, nessa imagem, vem dele próprio, o que não foi feito por mão de homem, porém impresso por ele mesmo, no pano. Compreendi-o mais claramente ainda, comparando minha reprodução com a Ceia de da Vinci: em leve nuvem de cabelos de um ruivo dourado, o rosto de um adolescente judaico de dezesseis anos parecendo uma rapariga inclina-se como uma flor que, apenas desabrochada, já se fana no talo quebrado; pálpebras pesadamente abaixadas, que se diriam inflamadas pelas lágrimas, e lábios cerrados numa resignação mortal: “Como uma ovelha muda diante daqueles que a tosquiam, não abre a boca”. De todos os semblantes do Senhor pintados pela mão do homem, é provavelmente o mais belo. Entretanto, entre o outro, o milagroso, e este, que diferença! Não sei se este vencerá a morte, mas sei que o outro já a venceu; este está ainda nas três dimensões e o outro está também na quarta; um exprime o suplício da dúvida e o outro a beatitude da fé; com este, talvez eu pereça, com o outro, eu me salvo com certeza.
IV
Três “lendas de ouro, legendae aureae, da Idade Média, exprimem o sentido profundo dessa impossibilidade de reproduzir, de traçar o semblante do Senhor. Logo após a Ascensão, os discípulos, reunidos no quarto de Sião e aflitos por não poderem mais ver o rosto do Senhor, suplicaram o pintor Lucas que o representasse. Mas Lucas recusou, dizendo que era tarefa impossível a um homem. Todavia, após três dias de lágrimas, jejuns e súplicas, certo do auxílio do céu, ele acabou por consentir. Traçou o contorno do rosto em negro sobre uma tela branca, mas antes que tomasse os pincéis e as tintas, todos viram a Face Miraculosa aparecer subitamente no quadro (4). A segunda lenda é de um ouro tão puro. Por três vezes, estando o Senhor ainda vivo, Lucas tentou reproduzir sua Face para Verônica, a hemorroidária; por três vezes, comparando o retrato com o rosto vivo, verificou que não havia entre ambos a menor semelhança e ficou muito triste. “Filho, não conheces meu rosto; só o conhecem lá de onde vim”, disse-lhe o Senhor. — “Eu comerei hoje o pão em tua casa”, disse ele a Verônica. E ela lhe preparou a refeição. Mas ele, antes de se pôr à mesa, lavou o rosto, enxugou-o numa toalha e nesta sua face se imprimiu como se fosse viva (5). Uma terceira lenda é de ouro ainda mais puro. Subindo ao Calvário, o Senhor curvava-se sob o peso da cruz e o suor corria de sua fronte em gotas de sangue. Verônica lhe estendeu um sudário e ele, enxugando a Face nele, a imprimiu terrível, a face de que fala o profeta Isaías (52,14.): “Seu rosto estava tão desfigurado e seu aspecto diferia do dos filhos do homem”. As três lendas têm o mesmo sentido: só no coração dos que amam o Senhor e sofrem com ele sua Face inexprimível se imprime como no sudário de Verônica.
V
Os santos lembram-se e os pecadores se esqueceram. É verdade que nada sabemos e nada podemos saber do rosto vivo de Jesus? Quantos são os falsos Messias, os ladrões e os bandidos de quem a memória da história guarda os semblantes ignóbeis e terá esquecido o do Cristo! Se assim fora, devíamos desesperar da humanidade. Uma lei estranha governa a memória que nossos olhos conservam dos rostos: quanto mais os amamos, menos nos lembramos deles. Recorda-se melhor o rosto de um estranho do que o de um ente amado de quem estamos separados. Quanto ao nosso próprio rosto, nenhum de nós se lembra dele, parecendo nisto “a um homem que olha num espelho seu rosto natural, e que, depois de se ter olhado, vai embora e esquece como é (Jac., 1, 24) Essa falta de memória talvez venha do homem ter dois semblantes: um externo, que não passa de máscara, o outro interno, que é o verdadeiro: O rosto interior transparece através do exterior tanto mais claramente quanto o homem é maior e mais sincero. Transparece, pois, em Jesus, o maior e o mais sincero dos homens melhor do que em ninguém. Eis por que, nos primeiros testemunhos, os mais próximos dele, seu rosto exterior foi esquecido, enquanto que o interior está mais presente do que qualquer outro rosto em qualquer outro testemunho histórico.
VI
Paulo pode não querer “conhecer o Cristo segundo a carne” (11, Cor, 5, 16.), conhece-o apesar disso. “Trago em meu corpo , os estigmas, STIGMAT, de Jesus (Gál., 7, 17.)”. Esses estigmas são provavelmente semelhantes aos de São Francisco de Assis, que se reabrem e por vezes sangram como verdadeiras chagas feitas de fresco pelos cravos. Para ser assim co-crucificado com o Senhor, Paulo devia sentir o corpo dele como seu e, naturalmente, ver seu rosto. Quando diz: “Deus enviou seu próprio filho em uma carne semelhante, homoioma, à nossa carne de pecado” Rom., 8, 3.) para ele essa “carne semelhante” absolutamente não é um “fantasma”, phantasma, como será mais tarde para os docetas, porém uma carne tão real como a de todos os homens, embora de outra qualidade. “Não vi Jesus?” pergunta (1 cor., 9, 1.); em todo o caso o vê, quando diz: “Jesus Cristo… se fez pobre para nós (II Cor., 18, 9.). Ele próprio se aniquilou — se esvaziou, tomando a forma de um escravo… ele próprio abaixou-se, tornando-se obediente até a morte, mesmo até a morte sobre a cruz (Fil., 2, 7-8)”. Sob essa forma de pobre, de humilde, de escravo obediente até a morte sobre a Cruz, Paulo não imagina abstratamente, mas sente fisicamente a carne viva do homem Jesus, vê seu rosto vivo; ao mesmo tempo, vê e sente nele outra carne; mais do que sabe meta-fisicamente, abstratamente, vê e sente carnalmente, fisicamente, que “toda a plenitude, PLEROMA, de Deus nele habita corporalmente (Col., 2, 9.)
VII
“Seu corpo não é de todo feito como o nosso”. Eis o que os mais íntimos discípulos do Senhor, que conhecem o Cristo “segundo a carne”, devem sentir ainda mais fortemente do que Paulo. Ele caminha sobre o chão, fala, come, bebe, dorme como toda a gente; e, de repente, num gesto, numa expressão do rosto, numa entonação, há qualquer coisa estranha, que não é mais humana, espécie de sopro ultraterrestre: para o olfato humano, o Espírito Divino é o que é o odor humano para o olfato animal. Como Paulo, não abstratamente, meta-fisicamente, mas corporalmente, fisicamente, sentem, percebem, na carne viva de Jesus um ponto “fantástico”, transparente, ardente, impalpável aos cinco sentidos, e mergulhando deste mundo no outro, ponto crescente, às vezes súbito como uma faísca que se torna labareda, tanto que o corpo, tomado e abrasado, se torna também ardente, transparente, fantástico. Para compreender e ver, não esqueçamos que para os homens desse tempo o “fantástico” não é, de modo algum, o que é para nós: não um “engano dos sentidos”, uma “alucinação”, não o que não existe, porém o contrário, o que existe em outra ordem, outra realidade. Vendo um fantasma, os homens se assombram, gela-se o sangue em suas veias, eriçam-se seus cabelos — como não ser uma realidade? “Um fantasma, PHANTASMA!” exclamam, aterrorizados, os discípulos, vogando sobre o lago de Genesaré, quando veem Jesus vir a eles, marchando sobre as águas (Mc., 6, 48-51.). Visão ou realidade? Pense-se o que quiser, uma coisa é clara: os homens que, pouco antes, haviam visto o rabi Jeschua, simples carpinteiro ou pedreiro, caminhar no chão, dormir, comer e beber, não teriam podido ver nem essa visão, nem essa realidade, se não tivessem sempre sentido que seu corpo não era de todo como o deles, se não tivessem discernido nele esse ponto fantástico, transparente, ardente.
VIII
Clemente de Alexandria relata que a tradição da “fantasmacidade” do corpo do Senhor se conservou até fins do século II, no círculo dos discípulos de João — quer se trate do Apóstolo ou do Presbítero, o que pouco nos importa (6). “O Senhor jamais revestira um corpo humano, mas era um fantasma, phantasma (7) ”, tal é a absurda e grosseira dedução que, mais tarde, será tirada pelos docetas dessa tradição, em que talvez persistam traços do que verdadeiramente experimentaram os mais próximos discípulos do Cristo, aqueles que o conheceram “segundo a carne” e do que Paulo quis exprimir, falando da “carne semelhante”, homoioma, de Jesus. Parece que é ainda o eco da mesma tradição que encontramos nos “Atos de João”, que Leucius Charinus, gnóstico pertencente ao círculo dos discípulos de Éfeso, escreveu em fins do século II, duas ou três gerações após a morte de João, o misterioso velho, tão próximo pelo espírito do “discípulo que Jesus amava”. “Ele me tomava sobre o colo, quando estávamos deitados um junto do outro, durante a Ceia, e, quando me apertava de encontro a seu peito, eu o sentia ora macio e liso, ora duro como uma pedra, e, quando queria retê-lo, tocava um corpo, às vezes material, carnal, às vezes irreal e sem existência… E, atravessando-o, minha mão sentia o vácuo (8)”. De novo é visão ou realidade? É ainda um “engano dos sentidos”, uma “alucinação”, como no lago de Genesaré, quando os discípulos viram um “fantasma”; ou é a visão de outra realidade? Passava-se alguma coisa unicamente interior no corpo do discípulo ou de interior e exterior nos dois corpos, o do discípulo e o do Mestre? Seja qual for nossa opinião, é possível que essa tradição nos tenha conservado um testemunho autêntico sobre o que, conforme a palavra de outro João, provavelmente o “discípulo amado de Jesus”, “era desde o começo, o que ouvimos, o que vimos com nossos olhos, o que contemplamos e que nossas mãos tocaram (I Jo., I, I.)”. sobre o Filho de Deus vindo ao mundo sob a aparência da carne. “Muitas vezes acontecia-me, caminhando atrás dele, procurar seu rasto no chão, e não o encontrava e me parecia que ele andava sem tocar o solo”, relata o mesmo João desconhecido (9). Aquele que, com ligeiro passo de fantasma, anda sobre a pedra, onde não pode deixar rasto, começa, e aquele que caminha sobre a água acaba: isto está ligado a isso, mas por algum laço interior somente ou interior e exterior ao mesmo tempo? Ainda uma vez não o sabemos e não temos necessidade de saber para tocar com a mão de seu discípulo a carne interior do Senhor através da carne exterior, para ver com os olhos de seu discípulo o rosto interior do Senhor através do rosto exterior, e só de nós depende unir essas duas faces numa só, aquela mesma de que foi dito: “Eis que estarei com todos vós até o fim do mundo. Amém (Mt., 28, 20.)”.
IX
Os “Atos de João” conservaram-nos também uma outra tradição proveniente do mesmo círculo de discípulos de Éfeso. “Ele nos levou, eu (João), Pedro e Tiago sobre a montanha, onde costumava rezar. E vimos sobre ele claridade tal (glória, dóxe) que nenhuma palavra humana poderia exprimir. E, aproximando-me dele devagarinho, de modo que não ouvisse, parei e olhei por trás e vi que nenhuma veste e nada do que víamos (antes) nele não havia mais e que não era um homem. E seus pés eram mais brancos do que a neve, de sorte que o chão estava iluminado, enquanto que sua cabeça tocava no céu. E eu gritei apavorado. Mas ele, voltando-se para mim, ficou de novo como um homem e, tocando no meu queixo, disse: “João, não seja incrédulo…” E eu lhe disse: “Senhor, que fiz?” E ele me respondeu: “Não tente aquele que não é tentado (10)”. Uma curiosidade ávida de criancinhas, ingênuas astúcias, medos pueris, um Mestre com pena de seus discípulos como um adulto tem pena de crianças — tudo isso é pintado com cores tão singelas, ingênuas e vivas que, mais uma vez, se tem a impressão de uma reminiscência autêntica, embora muito confusa: os homens veem o semblante do Senhor como os peixes avistam o sol através da água.
X
O homem possui um Duplo imortal, a imagem luminosa de seu outro corpo “espiritual”, de seu “rasto interior” que se chama Ka. Eis o que nos ensina o “Livro dos Mortos” egípcio, o mais antigo livro do mundo. É o “corpo pneumático”, (pneumatikos), espiritual, do Apóstolo Paulo. Parece bem que nos “Atos de João” se trata de um “Duplo” do Homem Jesus: “Isto se passou em uma casa de Genesaré, onde então passávamos a noite com o Mestre. Tendo enrolado a cabeça nas minhas vestes, observava o que ele fazia e ouvi a princípio me dizer: “João, dorme”. E fingi dormir e então vi outro semelhante a ele e ouvi esse outro lhe dizer: “Aqueles que escolheste não creem em ti, Jesus”. E o Senhor lhe respondeu: “Dizes a verdade, mas eles são homens (11)”. O que é o Duplo de Jesus que João não reconheceu compreenderíamos talvez, se soubéssemos ler o apócrifo Pistis Sophia, essa lenda-recordação tão confusa que parece transparecer através da água turva de profundo sono e em que se vê Jesus-Adolescente e o Espírito Adolescente “perfeitamente semelhantes um ao outro”, unindo-se num beijo de amor celeste (12).
XI
Não seria esse mesmo Duplo, o “corpo astral” de Jesus, seu misterioso Ka, que aparece em outro “Evangelho Oculto”, o Apócrifo de Mateus: “E, quando Jesus dormia, de dia ou de noite, a luz de Deus resplandecia sobre ele, claritas Dei splendebat super eum (13)”. A mais pueril de nossas ciências, a metapsíquica, dá a esse corpo luminoso do homem o termo incompreensível de “Aura”, em lugar da palavra do Evangelho “claridade”, “glória”, DOXE. O próprio Senhor fala dessa luz: “Se, pois, todo o teu corpo está iluminado sem que haja em ti nenhuma parte tenebrosa, ele será clareado como um facho que se ilumina com sua própria luz (Lc., II, 30.)”. Esse “facho” interior é precisamente o “corpo espiritual”, o semblante interior do homem. Os antigos pintores de imagens que rodeavam com uma auréola de ouro a Face Divina do Cristo tinham talvez visto bem o semblante humano de Jesus. Agora, só as criancinhas e as velhinhas continuam a ver uma auréola em torno da Face do Senhor. Mas, se o rosto humano de Jesus não se iluminar para nós com esse nimbo divino, jamais o veremos.
XII
“Eu me via adolescente, quase criança, numa igreja baixa da aldeia. Círios finos brilhavam em pequenas nódoas rubras diante de imagens antigas e uma pequena coroa irisada rodeava cada chama. A igreja era escura e triste. Mas havia muita gente diante de mim. Somente louras cabeças camponesas. De tempos em tempos elas se punham a ondular, a se curvarem, a se levantarem, na lenta ondulação do vento do estio. De repente, um homem se aproximou por trás de mim e parou bem perto. Voltei-me, mas senti imediatamente que esse homem era o Cristo. Logo, o enternecimento, a curiosidade, o medo, juntos, se apoderaram de mim. Fiz um esforço sobre mim mesmo e olhei o meu vizinho. Seu rosto era como o de toda a gente — um rosto parecido com todos os rostos humanos. Os olhos olhavam um pouco para cima, atentamente e suavemente. Os lábios estavam fechados, mas não cerrados; o superior parecia repousar sobre o inferior; a barba curta era dividida ao meio. As mãos cruzadas não se moviam. E suas vestes também eram como as de toda a gente. “Este, o Cristo?” pensei, “este homem tão simples, tão simples? Não é possível!” E não olhei mais para ele. Mas, apenas mudei o meu olhar desse homem simples, acreditei que era precisamente o Cristo que estava a meu lado. E, de novo, fiz um esforço sobre mim… E, de novo, vi o mesmo rosto semelhante a todos os rostos humanos, os mesmos traços conhecidos, embora desconhecidos. E, de súbito, me enchi de medo e voltei a mim. Somente então compreendi que era mesmo um rosto assim — igual a todos os rostos humanos — que era o do Cristo (14)”. Esse “Apócrifo”, esse Evangelho, não falso, mas secreto, sobre a Face do Senhor, só podia ser escrito por um homem que, tendo renegado o Cristo, conservasse no fundo do coração sua imagem, pelo filho daquela terra de que se disse; “Ó minha terra natal, O Rei do Céu, sob o aspecto de um escravo, Curvado ao peso da Cruz, Percorreu-te inteiramente, Abençoando-te (15)”.
XIII
“Ele se tornou semelhante a todos os homens e tomou o aspecto de um homem”, diz Paulo (Fil., 2, 7-8). “Por seu aspecto não diferia nada dos outros homens”, diz por sua vez Celso, no século II, relatando provavelmente uma antiquíssima tradição, vinda de uma fonte que ignoramos (16). “Ele tinha o rosto de todos nós, filhos de Adão”, confirma João de Damasco no século VIII, remontando também a tradições que parecem datar dos primeiros séculos do cristianismo (17). “Seu rosto era o de toda a gente, um rosto igual a todos os rostos humanos”, repetirá vinte séculos depois de Paulo o Apócrifo russo. Se, em matéria de religião, pode haver provas, são unicamente como estas coincidências involuntárias e necessárias entre experiências interiores, infinitamente separadas no tempo e no espaço. O próprio Jesus se chama “Filho do Homem”, Barnascha em aramaico, isto é, simplesmente “o homem”. Não é o mesmo que dizer precisamente: “Eu sou como toda a gente”? Mas, se seu rosto exterior é o de “toda a gente” seu rosto interior não é o de “pessoa alguma”.
XIV
Duas Faces miraculosas: a Face romana, ocidental, sobre o sudário da Verônica — o Escravo sofredor; e a Face bizantina, oriental, sobre o lenço de Abgar — o Rei Triunfante, “Rex tremendae majestatis”, que aparecerá ao mundo nesse derradeiro dia em que os homens dirão às montanhas e rochedos: “caí sobre nós: ocultai-nos da vista daquele que está sentado no trono e da cólera do Cordeiro (Apoc., 6, 16-17)”. Essa contradição concordante, essa antinomia — “como toda a gente” — “como ninguém” — é uma das causas da impossibilidade em que estamos de representar a Face do Senhor.
XV
A tradição da Igreja sobre a Face Divina se dividiu em duas. Jesus é belo, afirma uma metade, que parece antiquíssima, da tradição. Há talvez no Evangelho de Lucas uma alusão à beleza de Jesus. Se a palavra grega KARIS, em latim gratia, no versículo sobre Jesus menino (2, 52.), se refere não somente a seu espírito, mas também a seu corpo, o que é tanto mais provável que o termo precedente, elixia (não a idade — no sentido de número de anos, como às vezes se traduz, porém o “crescimento”), se reporta igualmente ao corpo, então KARIS significa “beleza”, “graça”, gratia, de modo que o sentido geral do versículo é: “Jesus crescia e se embelezava”. Entretanto, não esqueçamos que a palavra humana “beleza” não corresponde ao que assim chamamos no seu semblante. Mas, se se não encontrasse aí isso para que não temos nome, uma simples mulher teria podido exclamar, vendo-o: “Bem-aventurados os flancos que te carregaram e o seio que te amamentou!” (Lc., II, 27.)? E, na Transfiguração, seu rosto, “se tornaria resplandecente como o sol” (Mt., 17, 2.) ? Os “Atos de João” chamam-lhe “O Belo”, O KAROS, como se essa palavra bastasse aos homens para saberem de quem se trata (18). “Para nós, que desejamos a verdadeira beleza, só ele é belo”, declara Clemente de Alexandria, exprimindo assim esse sentimento natural e indesenraizável nos homens (19): “Tu és belo, mais belo do que qualquer outro filho do homem (Ps., 45, 3.)”.
XVI
Isso é numa metade da tradição, mas, segundo a outra, também antiga, Jesus é “feio”. “Seu rosto era desfigurado entre os homens e seu aspecto diferia do dos filhos do homem”. Essa profecia também se realiza nele (Is., 52, 14.): “Ele se aniquilou — se esvaziou”, em tudo e nisso. “Ele era, dizem, pequeno, feio e sem nobreza”, relata Celso, citado por Orígenes (20). “Ele não tinha aparência… nem glória… e seu aspecto era desprezível”, dirá por sua vez Justino Mártir, que talvez conhecera os que haviam visto o rosto vivo de Jesus (21). As mesmas testemunhas — e é o mais espantoso — falam ora de sua beleza, ora de sua feiura, como Clemente de Alexandria, que emprega esta palavra intraduzível, “blasfematória”: AISKROS (22). O próprio Irineu, que afirma que nada sabemos da imagem carnal de Jesus, sabe, todavia, que ele era “raquítico e sem majestade”, infirmus et ingloriosus (23). “… Eu sou um verme do chão e não um homem. O opróbrio dos homens e o desprezado do povo (Ps., 22, 17.)”. Estas terríveis palavras tomadas ao mesmo salmo em que está o grito da cruz, Sabachtani, Tertuliano as porá na própria boca do Senhor (24).
XVII
A Igreja, a Esposa, começou por esquecer o semblante do Cristo, do Esposo, depois sonhou que era um monstro. Como se produziu isso? Talvez muito por causa do medo da beleza corporal, da tentação pagã, fonte de idolatria, que o judaísmo legou ao cristianismo. Mas isso não explica tudo. As raízes das duas tradições sobre a beleza e a feiura do semblante do Senhor parecem mergulhar numa reminiscência muito obscura, porém autêntica. Não havia no rosto do Homem Jesus, como na sua vida, — algo de “paradoxal”, de espantoso — de “apavorante”, passando das três dimensões à quarta em que tudo é ao contrário, tanto que o que é feio na terra, lá é lindo? Se o semblante de Jesus é tão especial, tão pessoal, tão diverso de todos os outros semblantes humanos, não será precisamente porque escape a todas as medidas humanas de beleza ou feiura, sendo incomensurável à nossa estética de três dimensões? Compreende-se, então, que não só os que viram esse rosto não se lembrem mais, como os próprios que o veem são impotentes a decidir qual das duas profecias se realizou nele: “Seu rosto era desfigurado entre os homens” ou então: “Tu és mais belo do que qualquer outro dos filhos do homem”. “Ele era belo e feio, formosum et foedum”, eis o que os “atos de Pedro” talvez bem compreenderam (25). Aqueles que veem esse rosto experimentam uma alegria sem par e também um pavor sem igual. À primeira antinomia nele: “como todos — como ninguém”, corresponde esta: “como um verme — como o sol”.
XVIII
Recordemos, não só, o que é pena, o “encantador doutor” de Renan, o “Bem Amado” de Madalena (vilania contemporânea única nos séculos), mas também as estatuetas de porcelana de Jesus nas igrejas, e, se ainda temos bastante gosto para detestar essa ignomínia de enojante insipidez, que é a “alma do açúcar” de Maeterlinck — compreenderemos talvez que essa “beleza-feiura” do Semblante do Senhor, tão inconcebível, tão apavorante para nós, é o amargo antídoto do veneno dulçuroso, e que nisso os primeiros séculos do cristianismo guardaram algum conhecimento e alguma lembrança do rosto de Jesus.
XIX
“Eu não sou o que pareço (26)”. Este agraphon do Senhor nos “Atos de João” permite-nos talvez entrever o que realmente sentiam aqueles que viam o rosto vivo de Jesus. O segredo dessas expressões foi explicado e, ao mesmo tempo, aprofundado por Orígenes: “Sendo ele mesmo, aparecia aos homens como se não fosse ele — cum fuisset ipse, quasi non ipse omnibus videbatur. Não tinha um único aspecto, mas mudava de aspecto conforme a maneira com que cada qual o podia ver; a cada qual aparecia com o aspecto que cada qual merecia (27)”. Eis porque Antonino Mártir não consegue também ver na imagem miraculosa a “Face perpetuamente mutável”. “O semblante do Cristo é diferente entre os Romanos, os Helenos, os Hindus, os Etíopes, porque cada um desses povos afirma que o Senhor lhe apareceu sob o aspecto que lhe é próprio”, diz o patriarca Photius (28). Assim, o rosto do segundo Adão, Jesus, se reflete em todos os rostos humanos, como o sol nas gotas de orvalho.
XX
“Vós me vereis em vós como um homem vê seu rosto em um espelho (29)”. Como as pedras inanimadas, os rostos humanos são imóveis, imutáveis; somente seu rosto, chama viva, é perpetuamente mutável, cambiante: por isso a vista não o pode apanhar, nem a mão o reproduzir. “Glória a ti, Jesus multiforme, POLIMORPHOS”, dirão os “Atos de Tomás” (30). “As representações da Face do Senhor mudam por causa da diversidade de inúmeros pensamentos”. Santo Agostinho assim o compreendeu exatamente, porém tirou a dedução inexata de que nada sabemos sobre o semblante de Jesus. No Juízo Final, ele próprio recordará muitos desses rostos: “Tive fome e não me destes de comer, tive sede e não me destes de beber, era estrangeiro e não me acolhestes, estava nu e não me vestistes, enfermo e prisioneiro não me visitastes (Mt., 25, 42-43)”. No rosto de cada um de nossos irmãos sofredores, há seu rosto: “Viste teu irmão, viste teu Deus (31)”.
XXI
Os “Atos de João” nos transmitiram um apócrifo estranho e apavorante. Trata-se do primeiro apelo dos discípulos João e Tiago, filhos de Zebedeu, sentados numa barca do lago de Genesaré. Que quer de nós este rapazinho? Por que nos chama da margem? disse-me meu irmão Tiago. E eu (João) lhe perguntei: Que rapazinho? E ele me respondeu: Aquele que nos faz sinal com a cabeça. — Estás com a vista perturbada, meu irmão Tiago, pelas muitas noites sem dormir que temos passado no lago. Não vês diante de nós um homem alto, de lindo rosto que nos olha alegremente? — Não, não o vejo, mas aproximemo-nos da margem e saberemos do que se trata. Quando abordamos à praia, ele nos ajudou a amarrar barca e nós o seguimos. E, enquanto caminhávamos, eu o via velho, calvo, com uma longa barba espessa, e meu irmão Tiago via um mancebo, com uma penugem apenas visível nas faces. E nós não compreendíamos o que isso significava… e estávamos muito surpresos. … Em seguida, aparecia muitas vezes também sob aspectos ainda mais maravilhosos… ora como um homenzinho de membros disformes, ora como um gigante cuja cabeça tocava o céu (32). É um conto absurdo ou, de novo, uma visão de peixe olhando o sol através da água — a lembrança confusa, monstruosamente deformada pelo delírio do que realmente experimentaram os supersticiosos pescadores galileus, ingênuos como crianças, vendo o semblante do Senhor, que excede das três dimensões e não se contém de todo na nossa geometria terrestre? Talvez seja uma recordação análoga a que igualmente nos conservou o Evangelho. “Ele tinha uns trinta anos”, diz Lucas (3, 23.). “Ainda não tens cinquenta anos”, dizem os Fariseus ao Senhor no IV.° Evangelho (8, 57.). Parece ora moço, ora velho; é isso o que significa: “Ele não tinha um só aspecto, mas o mudava conforme a maneira com que cada um o podia ver”. “Um lobisomem divino”, teria dito, blasfemando, Luciano-Voltaire: os discípulos não o dizem, porém sentem talvez a mesma impressão, adorando, sem ousar olhá-lo, esse rosto-chama, terrivelmente e maravilhosamente cambiante.
XXII
O mais comum dos rostos humanos e que os contém todos, como a figura geométrica do triângulo contém todos os triângulos — o rosto do segundo Adão — esse é um dos polos; e eis o outro: o mais especial dos rostos humanos, o único verdadeiramente pessoal e que se não parece com nenhum outro. São os dois polos que é necessário reunir para ver seu rosto vivo. Todas as representações da Face do Senhor — desde o Bom Pastor das Catacumbas, cujo rosto imberbe faz pensar em Hermes, até o Salvador miraculoso, “rei de terrível majestade”, dos mosaicos bizantinos — não são mais do que as tentativas ávidas, insaciáveis, dos séculos e dos povos para achar esse semblante vivo. O que melhor nos informa sobre essas tentativas é um apócrifo muito tardio do século XI ou do XII, porém extremamente precioso, porque, como um mosaico de pedrinhas miúdas, é composto de elementos antiquíssimos, verossimilmente autênticos — “A Carta do procurador Lentulus ao Senado Romano”: É um homem de estatura medíocre… tem um semblante venerável, tanto que os que o olham podem, ao mesmo tempo, temê-lo e amá-lo. Os cabelos são de um louro escuro, lisos até as orelhas, e daí para cima ondulantes e anelados, com um leve reflexo azulado e quente. São divididos ao meio no alto da cabeça à maneira da gente de Nazaré. A fronte é lisa e muito serena… Sua barba é abundante, da cor dos cabelos, bastante curta e dividida no queixo. Sua fisionomia respira a simplicidade e a madureza. Seus olhos são cambiantes e brilhantes. É terrível nas reprimendas, doce e amável nas admoestações, alegre sem deixar de ser grave. Ninguém jamais o viu rir, porém muitas vezes chorar. Assim, com toda a razão, dele se pode dizer, segundo o profeta: “É o mais belo dos filhos dos homens” (33).
XXIII
Encontramos em João Damasceno, que vivia no século VIII, e no último historiador eclesiástico, Nicéforo Calisto (século XIV) dois outros apócrifos ou tradições sobre o semblante de Jesus. Ambos se referem a testemunhos antiquíssimos, desconhecidos de nós, que, a julgar pelo que diz João Damasceno, remontam aos primeiros séculos do cristianismo: concordam com o que Santo Agostinho nos diz das numerosas imagens, “continuamente mutáveis”, da Face do Senhor, que existiam antes dele. É muito provável que todos três, o Damasceno, Lentulus e Calisto, tenham, cada um de seu lado, se abeberado em fontes comuns muito antigas. Os “sinais particulares” a que alude Damasceno — “sobrancelhas bem próximas, quase unidas; barba negra, nariz fortemente recurvado” — do mesmo modo que “a tez escura do rosto”, de que fala Calisto, e “a cor ruiva (rubra) da barba”, de uma das versões de Lentulus (34) — não serão marcas da raça judaica? Acha-se igualmente em Calisto dois ou três “sinais particulares”: “cabelos cor de trigo maduro, molente ondulados, com sobrancelhas escuras; olhos claros em que brilha uma bondade indizível e que são penetrantes… tem os ombros um pouco encurvados… é doce, humilde, gracioso… Parece em tudo com sua divina mãe (35)”.
XXIV
Assim, pouco a pouco, lentamente, penosamente, traço a traço, como se forma um mosaico precioso, pondo uma pedra depois de outra pedra, se compõe a Face Miraculosa, única e multiforme, cujas inúmeras imagens, “continuamente mutáveis”, coincidem, às vezes, de modo notável, nos menores “sinais particulares”. Lembremo-nos do “lábio superior repousando sobre o inferior”, no apócrifo russo, e exatamente do mesmo lábio ligeiramente inflamado, como o de uma criança triste que chorou, no desenho de da Vinci; lembremo-nos dos “cabelos leves flutuando sobre os ombros”, no apócrifo de Lentulus, da “cor ruiva da barba”, em Calisto, — sinais indubitáveis do sangue judaico, do mesmo modo que o nariz finamente arqueado como o de uma rapariga, e a cor ruiva dos cabelos do desenho de da Vinci; lembremo-nos, enfim, dessa “risca no meio da cabeça”, que se vê desde o século VI até hoje, como da “barba partida ao meio”. Dir-se-ia que pessoas, infinitamente diferentes, separadas pelos séculos e pelos povos, ignorando tudo uma das outras, representaram em inúmeras imagens um mesmo rosto vivo, o qual, desde nossa infância, nos é familiar e que reconhecemos à primeira vista. Jesus o Nazareno foi realmente como hoje o conhecemos, o lembramos ou imaginamos? “Nada sabemos do seu rosto”, respondem Irineu e Agostinho. Nós acreditamos muito facilmente, porque dos dois sentidos da palavra “parusia”, o mais antigo, profundo e autêntico se perdeu para nós. Essa palavra não significa somente a “segunda vinda” do Senhor, como se compreendeu desde os primeiros séculos do cristianismo até nossos dias, porém ainda sua eterna presença: “Eis que estarei convosco até a consumação dos séculos. Amém”. Aqueles com quem ele está sempre não podem ver-lhe o rosto? Não, os homens não ignoram de todo seu semblante, lembram-se e não esquecerão nunca: na memória e no coração da humanidade, a Face do Senhor que ele marcou nela de modo inapagável e milagroso não é um vão fantasma. Pode-se mesmo dizer que é o único semblante que a humanidade viu e não esqueceu — que não esquecerá jamais e que verá sempre: os outros semblantes não passam de fantasmas e sombras fugidias: somente ele é o sol.
XXV
Então, que significam estas palavras: “Não conhecemos seu rosto”? Querem dizer que, nos nossos dias, não haverá ninguém para dizer ao Cristo: “Tu és Jesus,” com tanta força quanto outrora Pedro disse a Jesus: “Tu és o Cristo”, — ninguém para ver no semblante divino do Cristo o semblante humano de Jesus, — ninguém para ouvir dizer: “És feliz, Simão, filho de Jonas; porque não foram a carne e o sangue que te revelaram isso, porém meu Pai nos céus (Mt., 16, 17.)”. Parece que nos acontece o que aconteceu aos dois discípulos no caminho de Emaús, quando o próprio Senhor, se aproximando, andou a seu lado. “Mas seus olhos estavam turvos e não o reconheceram”. E, quando o reconheceram, “Ele ocultou-se à sua vista. E eles disseram um ao outro: Nosso coração não queimava dentro de nós?” (Lc., 24, 15, 32). É assim que no caminho, terrivelmente longo, que vai da primeira à segunda vinda e que chamamos História, ele caminha a nosso lado. É assim que nós também não o reconhecemos. Oh! se nosso coração pudesse também queimar dentro de nós!
