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Diferentes Escolas Filosófica (HCOP)

A diversidade das escolas ou seitas (aireseis) não inspira ceticismo em Orígenes: ela lhe parece inevitável. “Em toda matéria de estudo que tem um fundamento sério e é útil à existência, encontram-se seitas.” Tal é a medicina, tal é também a filosofia: Uma vez que o objetivo da filosofia é ensinar a verdade e o conhecimento dos seres, já que ela expõe como viver e tenta nos ensinar o que é útil à nossa raça, já que as questões que ela coloca permitem uma grande diversidade de opiniões, ela dá origem a um número considerável de seitas, das quais umas são célebres e as outras menos. O judaísmo também conhece diversas escolas rabínicas. Mas ninguém recusa a medicina por causa das seitas que existem nela: da mesma forma não é concebível que, procurando o que convém, se odeie a filosofia, dando por pretexto a multiplicidade das seitas. Pode-se, de fato, aplicar à filosofia, assim como ao cristianismo, a observação de São Paulo, I Cor. XI, 19: “É necessário que haja seitas entre vocês a fim de que elas manifestem aqueles cuja virtude é provada”: Se se pode considerar competente o médico que se exercitou em diferentes seitas, as examinou com sabedoria e escolheu a melhor, aquele que é competente em filosofia da mesma forma conheceu muitas doutrinas, se exercitou em cada uma delas e deu seu assentimento àquela que se sobressai. É por isso que em sua escola de Cesareia, seguindo o testemunho de São Gregório o Taumaturgo, Orígenes fazia ler filósofos de toda escola, para desenvolver o senso crítico de seus alunos e impedi-los de se apegarem idolatricamente a um sistema tomando-o pela verdade absoluta. O cristão adere assim apenas à Palavra de Deus: nos filósofos ele toma seu bem onde o encontra. Essas divergências não se referem, além disso, a pontos menores.

Há uma hierarquia a ser estabelecida entre essas seitas. Orígenes proibia a seus alunos a leitura dos ateus. Estaria errado, ele pensa, acusar a filosofia por causa dos sofistas, epicuristas e peripatéticos, de todos aqueles que pensam mal. Certas escolas são superiores às outras e participam um pouco do Logos; outras, epicuristas ou peripatéticas, pronunciam palavras perversas e ateias, suprimem a Providência e dão ao homem um outro objetivo que não a busca do bem.

A sabedoria de Deus, distinguida segundo I Cor. II, 6-7, da do mundo e da dos príncipes deste mundo, engloba, segundo uma passagem do Contra Celso, contrariamente à interpretação habitual de Orígenes, certas escolas filosóficas: a demarcação se situa então entre as doutrinas materialistas e as espiritualistas, mesmo se estas últimas não têm, como Abimeleque, “atingido plena e perfeitamente a regra da religião”. Os sábios deste mundo não se ocupam “das realidades inteligíveis, invisíveis e eternas”, mas apenas das sensíveis, que sozinhas têm para eles importância: suas doutrinas “são favoráveis à matéria e aos corpos, eles dizem que as substâncias primordiais são os corpos e que nada existe do que se chama invisível ou incorpóreo”. Os materialismos epicurista e estoico são visados por essa condenação. Mas as doutrinas que fazem a alma subir das realidades daqui de baixo até a beatitude que a espera perto de Deus, no que se chama seu reino, aquelas que ensinam a desprezar como transitório o sensível e o visível, para que se apresse em direção ao invisível e se contemple o que não se vê, (a Palavra divina) as chama de “Sabedoria de Deus”. Tal é sobretudo o platonismo.

Outra passagem do mesmo livro dá a ordem das preferências filosóficas de Orígenes em matéria de escolas, começando pelo pior: é o desfile dos maus médicos em quem Celso confia para curar as feridas das almas. Na frente marcham Epicuro e os seus, negadores da Providência, partidários do prazer. Vêm em seguida os peripatéticos, eles também negadores da Providência, suprimindo toda relação entre o homem e Deus. Em terceiro lugar os estoicos e seu deus material, corruptível e mutável. Finalmente aqueles que professam “a estupidez da metensomatose”. Os pitagóricos são aqui diretamente visados, que querem que as almas passem para corpos de animais e mesmo para seres “sem imaginação” (aphantaston), alusão verossímil às favas. Mas os platônicos também são atingidos, pois Orígenes lhes dirige frequentemente a mesma censura. Tal é a ordem que vamos seguir.

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