friedrich_oetinger:faivre-afpn-oetinger-a-alma-e-a-eletricidade

Faivre (AFPN) – Oetinger, a alma e a eletricidade

AFPN Os quatro elementos estavam inicialmente numa mesma raiz; mas o fogo e o ar tornaram-se ativos, a água e a terra passivos, sem que houvesse uma separação absoluta: todos conservam algo de sua origem comum, pois caso contrário nada poderia crescer, e as coisas de baixo não seriam atraídas pelas de cima. Os Schamajim, ou águas misturadas com Fogo, abaixo do céu, estão sempre prontas a descer através do espaço aéreo pela mediação do sol, da lua e das estrelas, com propriedades novas, graças ao sal. O que é o sal? Uma umidade que não molha, que é espiritual, mas também um óleo; é o começo do que pode existir de mais puro como elemento mercurial (p. 110 ss). Oetinger afirma ter visto nascer sal diretamente do mercúrio; constatou que esse sal possui a virtude magnética de ser atraído pelo fogo, o que lhe permite mudar de forma. Todos os nascimentos nos três reinos provêm do sal universal que contém os três princípios (Sal, Enxofre e Mercúrio). O próprio sal vulgar encerra o mais doce dos sais; a própria água corrente possui algo das forças magnéticas das águas superiores, e o sol contém um poder de magnetização capaz de atraí-las para si: elas despertam as energias solares, as da lua as esfriam e coagulam para transformá-las em sal. Assim, ler Moisés faz compreender melhor a química do que ler Becher; o Deuteronômio (XXXIII, 13-16) ensina que a terra de José é abençoada pelo maegaed, o aroma oleoso e especiado do céu, pelo orvalho e pela profundidade abaixo de nós, pelo maegaed tebhot schaemaesch, ou óleo dos rebentos do sol, e pelo maegaed gaeraesch jerachim, óleo doce expelido pela lua, pelo rosch, origem das câmaras do Oriente, pelo doce aroma de óleo das colunas da eternidade, da terra, de sua plenitude. O sol e a lua “especificam” nesses sais, embora estes provenham das câmaras do Oriente e das colinas da eternidade — isto é, das águas superiores, do scheme kaedam ou fontes eternas do céu, que são o veículo de Deus (o salmo LVIII, v. 34, chama Deus de “o cavaleiro dos céus”). Assim, as influências superiores são salinas mas doces; em nosso ar, misturam-se a elementos terrestres grosseiros para penetrar nos três reinos, onde o bem e o mal se opõem (p. 109-113). Entre o alto e o baixo realiza-se portanto um movimento circular, como ensinam os Provérbios III, 19-20. Esse alto e esse baixo interpenetram-se. Oetinger emprega a expressão “terra celeste” para fazer compreender que as energias de que fala são ao mesmo tempo etéreas ou espirituais e ligadas à matéria. Cluver e Swedenborg, cuja autoridade ele invoca, provam que tudo está organizado de tal modo que o sutil se una ao denso, como se vê no exemplo do ímã ou da eletricidade. Por mais sutis que sejam as forças do alto, como são terra celeste podem tornar-se terra; por isso Hermes diz: “Vis ejus integra est, si versa fuerit in terram” — versículo bem conhecido da Tábua de Esmeralda (Oetinger citava esses textos tradicionais mais voluntariamente que os dos físicos de seu tempo). Voltemos a Moisés, diz ele ainda; livremo-nos, como Geber e Lulle, dos termos responsáveis por disputas inúteis. Ambos tiveram o mérito de deduzir a origem dos metais a partir de dois tipos de “vapores contrários”; do mesmo modo, Hermes diz com Moisés: “O vento carregou em seu ventre os primeiros começos; o pai é o sol, a mãe é a lua.” Baldwin, em Aurum aureae, aproxima-se mais da ideia da origem dos metais a partir do ar e do fogo elétrico — mas foi Virgílio quem primeiro falou em “Aurum aureae”. Seria preciso, pensa Oetinger, multiplicar as experiências com água da chuva ou da neve, pois ela contém fogo elétrico; ver-se-ia que este, atraído magneticamente, é a verdadeira origem dos metais, a verdadeira chave da química. Ele já pode afirmar a respeito dos metais que existem duas luzes principais, a branca e a vermelha; a prata é o efeito da primeira, o ouro da segunda (o Apocalipse IV menciona cores brancas e vermelhas a respeito da própria divindade). Os metais consistem em mercúrio e enxofre; ora, o que é o mercúrio senão um arsênico fluido, o que é o enxofre senão uma substância vermelha não inflamável? Quando se retira dos metais seu enxofre, isto é, sua substância oleosa, eles se tornam mercúrio; mas é difícil recombiná-los, pois isso equivale a imitar a natureza, e não sabemos como age o fogo elétrico e elementar do qual toda a natureza precisa para fazer nascer os metais. Colonna escreve que muitas pedras crescem como árvores, depois como árvores que morrem endurecem quando o éter ou fogo elétrico não se incorpora suficientemente à matéria terrestre. O mesmo autor conta que sua servente, passando com ele diante de pequenos rochedos perto de Fontainebleau, observou que estes cresciam e se alimentavam, enraizando-se à maneira das árvores; acrescentou que em sua terra às vezes se tiravam pedras do fundo dos rios para colocá-las ao nível da água e que ao cabo de quatro ou cinco anos viam-se novas pedras que tinham crescido ao lado das primeiras (p. 119-124). O fogo elétrico, e toda luz, não se deslocam em linha reta a partir do sol mas em linha curva, como bem mostrou P. Pardies; isso permite ao fogo elétrico fixar-se e fazer nascer as pedras preciosas e transparentes (p. 124). O fogo elétrico de que se trata encontra-se portanto “em acordo”, diz Oetinger, com o de Hermes, de Arnaldo de Villeneuve, de Lulle, do Rosarium, de Sendivogius. Se esse elemento masculino se associa ao fogo elementar (elemento feminino), produz um sal que se transforma em dois enxofres metálicos, um quente e outro frio. Moisés — entendamos: o autor da Tábua de Esmeralda — tem portanto razão ao dizer que é preciso o concurso do sol e da lua para preparar a tintura. A Jacob Böhme cabe o mérito de ter compreendido isso muito melhor que antes dele Platão, Confúcio e mesmo Lulle. A alquimia tradicional tem muito a nos ensinar, sobretudo no que diz respeito ao “sal perfeito” que, Oetinger constatou várias vezes, traz em si a figura de inúmeros sóis e estrelas e representa a matéria elétrica mais nobre. Há uma analogia entre o ouro, o sal originário e o fogo elétrico, ou melhor, essas três substâncias possuem um spiritus rectoris análogo (o ouro não é feito senão de pequenas estrelas). Assim, nada substitui a experiência, a coisa vista, devidamente constatada; os livros são apenas uma ocasião para refletir. O peregrino em Cristo não desprezará a química: o Apocalipse de João é como que sua propedêutica, aliás ela dele procede em parte. Estudar a eletricidade e a química sem Cristo é privar-se de conhecer as raízes e as virtudes da verdade, pois sem ele corre-se o risco, como tantos pesquisadores, de deduzir todo princípio de um falso princípio único, seja a elasticidade, a própria eletricidade ou qualquer ideia “unilateral”; mas em Cristo estão encerrados os tesouros da Sabedoria e do conhecimento mais oculto das forças e energias; elas são reveladas nele à inteligência do homem de fé que sabe reuni-las, sintetizá-las (Zusammenfassung). O contato com as Escrituras tornará mais apto a compreender ao mesmo tempo Demócrito, Artefius, Geber, Lulle mas também Newton, Lascaris, Pot, Becher (p. 134). Quanto à alquimia, é preciso compreender que ela pode o que a química seria impotente para realizar sozinha; por exemplo, se é verdade que o fogo elétrico impregna tudo, só se pode “desligá-lo” pela alquimia (o que já Demócrito tinha percebido bem). Geber, Lulle, o autor do Rosarium, Sendivogius, Grassanus, Bernhardt, Grasseus assim como os três Filaletas realizaram essa Grande Obra, esse processo próprio à alquimia.

/home/mccastro/public_html/cristologia/data/pages/friedrich_oetinger/faivre-afpn-oetinger-a-alma-e-a-eletricidade.txt · Last modified: by 127.0.0.1