Kolakowski (LKCE) – Angelus Silesius, masoquismo e narcisismo
LKCE
Dessa forma, descobrimos no próprio fenômeno do amor essa duplicação primordial que se manifesta nos místicos sob a forma de uma oscilação incessante entre uma imagem dualista e uma imagem monista do Ser. Isso se dá entre uma visão de mundo onde a realidade formada pela multiplicidade é entregue ao poder do demônio, e outra, onde essa mesma realidade é divinizada como emanação teofânica de cada um de seus fragmentos. Nada mais comum, nos textos místicos, do que essa contradição entre a autocondenação masoquista no ato de amor quietista e autodestrutivo, e a adoração narcisista de si mesmo como encarnação da divindade. Em ambos os casos, a consciência individual, voltando-se para si mesma, concebe-se de fora como um exemplar desse mundo individualizado de coisas que, em sua totalidade, é ora Satanás, ora Deus, passivamente dilacerada pelo jogo do autoconhecimento que salta incessantemente de um extremo ao outro em sua autoapreciação.
