Deus Agnostos (OCC)

//Orígenes — Contra Celso, Vl, 17 (OCC)//

17. Em seguida, em sua intenção de vilipendiar as passagens de nossas escrituras relativas ao reino de Deus, não cita nenhuma, como se fossem indignas de qualquer menção, ou talvez porque não as conhecesse. Mas cita passagens de Platão extraídas das Cartas e de Fedro; apresenta-as como palavras inspiradas, ao passo que nossas escrituras nada disso teriam. Tomemos alguns exemplos para compará-los às sentenças de Platão que não deixam de ter força persuasiva, mas nem por isso dispuseram o filósofo a viver de uma maneira digna dele na piedade para com o criador do universo; ele não deveria nem adulterar nem manchar esta piedade com aquilo que chamamos idolatria, ou com um termo comum, com superstição.

O Salmo 17 assim fala de Deus: “Das trevas ele fez seu véu” (Sl 17,12). Este circunlóquio hebraico significa que as ideias de Deus que seriam dignas dele permanecem secretas e desconhecidas; pois ele por assim dizer se cobriu com um véu de escuridão para os espíritos que não suportam o brilho de seu conhecimento, incapazes de vê-lo, por causa da impureza que afeta a inteligência ligada ao corpo de miséria dos homens, ou por causa de sua própria pouca capacidade de compreender a Deus. E para fazer ver que o conhecimento de Deus raramente foi concedido aos homens e somente um número muito pequeno o possuía, está escrito que “Moisés aproximou-se da nuvem escura, onde Deus estava” (Ex 20,21), e ainda: “Só Moisés se aproximará do Senhor; os outros não se aproximarão” (Ex 24,2). E para mostrar que a profundeza das ideias sobre Deus é incompreensível para os que não possuem o Espírito que perscruta tudo e até as “profundidades de Deus” (1Cor 2,10), disse o profeta: “O abismo como um manto o cobre” (Sl 103,6).

Além disso, nosso salvador e Senhor, o logos de Deus mostra a sublimidade do conhecimento de seu Pai, pois ele é compreendido e conhecido como merece apenas por ele principalmente, e secundariamente por aqueles que têm o espírito iluminado por ele, que é logos e Deus. Ele declara então: “Ninguém conhece o Filho senão o Pai, e ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11,27). Ninguém de fato pode conhecer dignamente o incriado, o primogênito de toda a criação, como o Pai que o gerou, nem o Pai como o logos vivo, sua sabedoria e sua verdade. Ao se comunicar, ele afasta do Pai o que chamamos as trevas com que ele se isola e o abismo apresentado como seu manto: ele revela assim o Pai e quem tiver a capacidade de conhecê-lo conhece o Pai.