Jesus disse: A quem tenha em sua mão se o dará e a quem não, inclusive o pouco que tem o será tirado.
41. Jésus a dit : Celui qui a dans sa main, on lui donnera, et, celui qui n’a pas, même le peu qu’il a, on le lui prendra.
1 Jésus a dit : qui n’a pas, 2 à celui qui a dans sa main, 3 on donnera 4 et à celui 5 même le peu qu’il a, 6 on le prendra.
(1) Jesus said, “Whoever has something in hand will be given more, (2) and whoever has nothing will be deprived of even the little that person has.”
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Refere-se uma vez mais ao mistério essencial da revelação evangélica, o do Cristo, “vivo”, interior, oculto (v. Cristo oculto), e esta essencialidade justifica que o mesmo logion apareça nos sinóticos em cinco ocasiões, com desígnios até certo ponto confluentes embora distintos. (vide também Logion 70)
Em seu sentido direto o logion aponta a sem razão, pouco ética, de tirar ao que não tem para dar ao que tem; mas sua explicação razoável somente é possível quando se entende o ali implicado com o verbo TER. Quem tem o Filho tem a vida; quem não tem o Filho de Deus não tem a vida. (1Jo 5:12) O Filho é sempre o Filho do homem, o Cristo vivente, oculto, ou também é, segundo as muitas denominações parabólicas evangélicas, a Palavra, a boa semente, a medida perfeita, a candeia que não deve ser oculta, o tesouro escondido, ou a pérola fina de grande valor.
Segundo a antropologia cristã em sua vertente oculta, o homem espiritual, o segundo Adão, espírito que dá vida, possui em propriedade essa joia superior, quer dizer, o talento, a mina única, o denário, no qual está impressa a marca de Deus e a imagem de si mesmo, pois à imagem de Deus foi feito o homem pneumático no sexto dia.
Em cada homem terreno, em cada homem completo de espírito, alma e corpo, esta imagem de Deus é a essência, o espírito, do qual se pode dizer de maneira figurada que inicia sua descida desde o alto em seguida ao matrimônio inefável com o Adão psíquico — as almas, as filhas dos homens — ao que vivifica e mercê a cujos esponsais, este recebe em usufruto a graça que o espírito possui em propriedade.
Nas parábolas evangélicas é sempre o homem psíquico o servo que recebe a mina, os denários ou os talentos, segundo sua capacidade. Os talentos encomendados aos servos, o são em medida de cinco, dois e um segundo a parábola em Mateus. As duas primeiras medidas (cinco e dois) estão em relação proporcional com as medidas dos frutos da palavra semeada, segundo a parábola raiz do semeador.
Em verdade, a mina ou o talento único o recebe ao nascer todo homem psíquico e esse é o “dinheiro” ou tesouro celestial de que dispõe, depositado no fundo de sua consciência, para despertá-lo pouco a pouco, trabalhosamente, até possuir em empréstimo a imagem impressa na moeda e que não é outra coisa que o Filho do homem, quer dizer, o Ser essencial, o si mesmo de cada homem.
Assim como a consciência do homem psíquico acede gradualmente ao reconhecimento de seu verdadeiro Ser, o espírito, por meio de um difícil processo de transfiguração. O Filho do homem é até então, até que se consumam suas bodas sagradas, o oculto, o grande desconhecido para a maioria da geração humana, e cada grau de despertar da consciência à luz do Filho do alto se reputa pelos evangelistas como TER, tal como se põe na boca de João Batista: Aquele que crê no Filho tem a vida eterna; mas aquele que não crê no Filho não verá a vida, mas a ira de Deus sobre ele permanece. (Jo 3:36) O QUE SE TEM OU SE RECEBE, encontra-se já uma primeira referência no evangelho de Mateus, e se inscreve quando Jesus justifica sua decisão de falar em parábolas. Segundo o que ali se diz, o semeado no coração — como essência — de cada homem é a Palavra, que quando se ouve e se entende dá fruto segundo sua medida. Mas dado que o fruto da Palavra consiste em TER vida eterna, não há dúvida de que o que TEM a Palavra em sua mão — como diz o logion em sua versão do Evangelho de Tomé — andará na eternidade e bem-aventurança; no entanto o que NÃO TEM, se afirma, por sua privação de fruto, na natureza transitória, mortal, do psíquico, terminará no nada da morte.
Este esquema o repete o Evangelho de Mateus na Parábola dos Talentos. Veja também a parábola da Candeia Acesa, onde o resultado final, o juízo, que vem de manter sob a cama a irradiação da Palavra, o descreve sutilmente Mateus na parábola do Mordomo Infiel.
A terceira referência ao logion a dá o evangelista Marcos dentro da parábola da medida.
A última referência do logion, em Lucas, se dá na Parabola das Minas. O que sempre vem a buscar e salvar o Filho do homem oculto são todos aqueles conteúdos psíquicos que uma vez voltados para a palavra por um ato de metanoia transcendente, “se purgam como a prata e se provam como o ouro” (Zacarias, 13,9).