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“O panteísmo — religião secreta da Alemanha.” Essa observação de Heine, repetida milhares de vezes com inúmeras variantes, faz parte daquelas ideias gerais que, à primeira vista, parecem de uma justeza impressionante, mas que, se examinadas mais de perto, revelam-se estéreis. A lista estereotipada de nomes que se costuma enumerar em apoio a essa fórmula — de Mestre Eckhart a Schelling e aos românticos — difere de listas análogas, que seria possível elaborar a propósito de outras culturas, por uma continuidade inegável. De fato, se definirmos de forma suficientemente vaga o sentido da palavra “panteísmo” (por exemplo: “a crença em uma razão impessoal, organizando a ordem do mundo de uma forma que lhe é imanente”), não há razão para não tentar proceder da mesma forma para qualquer outro país, seja a Grécia antiga (“de Heráclito a Plotino, passando pelos estoicos”) e não declarar peremptoriamente: “o panteísmo é a substância da filosofia grega” (ou judaica ou espanhola). No caso dos gregos, tal afirmação é obviamente chocante, essencialmente porque a escolha dos nomes só poderá parecer artificial e desprovida de qualquer continuidade interna; na realidade, essa falta de continuidade testemunharia mais a favor da justeza de uma generalização feita levianamente, enquanto a continuidade efetiva não é uma prova da justeza da observação análoga feita a propósito da Alemanha. De fato, o fato de uma tendência panteísta se manifestar, em muitos casos independentes uns dos outros, e a partir de diferentes tradições, depõe mais a favor da fertilidade do “solo nacional” no que diz respeito a colheitas desse tipo, do que o fato da presença de uma “linhagem” estendendo-se por várias gerações, onde se pode observar nitidamente a transmissão das ideias por herança. O fato de que, em tais listas, a legitimidade do rótulo “panteísta” ser discutível para quase cada um dos nomes em questão, também no caso da Alemanha, joga em um sentido negativo; isso decorre simplesmente do lugar extremamente obscuro que o termo “panteísmo” ocupa na terminologia filosófica. Nossa objeção seria obviamente sem objeto se a generalização que citamos fosse própria de Heine e não retornasse correntemente na pena daqueles que têm pretensões de fazer história da filosofia. Parece-nos, por outro lado, mais racional refletir sobre os casos em que uma variante nitidamente definida do panteísmo se manifesta com particular intensidade em uma área geográfica mais delimitada e durante um período menos extenso. Uma certa “densidade” de religiosidade panteísta na Silésia, durante os primeiros cento e cinquenta anos de luteranismo, merece nossa atenção; mencionamos esse fato não para nos entregar a suposições que excedem nossas competências, mas apenas para sublinhar desde o início que a inspiração que incita Johannes Scheffler a escrever está especificamente ligada ao seu ambiente e à sua província, fato aliás conhecido e de certa forma atestado no próprio pseudônimo do autor. Segue um resumo de sua biografia: Stenzel Scheffler, o pai do poeta, era um alemão de confissão luterana, nascido em Cracóvia e nobilitado na Polônia por Sigismundo III. Em 1618, aos cinquenta e seis anos, estabeleceu-se em Breslávia, onde se casou; sua esposa lhe deu o primeiro filho em 1624. Johannes Scheffler viveu tempos turbulentos durante sua infância: guerras, invasões e saques, epidemias e diversos infortúnios; essa juventude, que transcorreu em uma época de desespero e terror, teria, segundo seus biógrafos, desempenhado um papel considerável no despertar de uma certa nostalgia religiosa na alma do poeta. Ele estudou no ginásio protestante de Santa Isabel, onde começou a praticar poesia. Saiu da escola em 1643 e, em maio, foi para Estrasburgo para estudar medicina; depois de um ano, foi atraído por Leiden, onde continuou seus estudos até 1647 e onde se interessou vivamente por questões religiosas. Posteriormente, em um de seus escritos, ele refutaria a acusação de ter, nessa cidade, estabelecido relações estreitas com menonitas ou anabatistas; ele reconhece, por outro lado, ter lido na época Jacob Boehme, a quem atribui um papel bastante considerável em sua conversão posterior. Pádua foi a próxima etapa: ele lá permaneceu em 1647 e 1648 e obteve o título de doutor em medicina. Retornou à Silésia em 1649; logo depois deixou Breslávia para Oels, onde foi nomeado, em novembro, médico ordinário do duque. Desse período data a amizade com os dois homens que talvez mais influenciariam o destino religioso do jovem médico: Daniel Czepho e, acima de tudo, Abraham von Franckenberg.