====== Deghaye (CHJB) – Psychologia Sacra ====== CHJB Ludwig Feuerbach, o autor de «A Essência do Cristianismo», definiu a obra de Jakob Böhme tanto como uma teosofia quanto como uma psicossófia. Aceitamos a palavra do filósofo materialista. Mas qual é o alcance de sua afirmação? Segundo Feuerbach, os mistérios da teologia e da metafísica são explicados pela psicologia. Seguindo sua demonstração, Böhme nos dá a prova mais eloquente disso. Toda metafísica, declara Feuerbach, é apenas uma psicologia //esotérica//. Mas em que sentido isso deve ser entendido? Deve-se reduzir a teologia à metafísica, seguindo a acepção que um filósofo moderno dará a esta última? Nesta hipótese, afirmaremos que a teosofia de Böhme não é nada menos que uma metafísica. O pensamento de Böhme se organiza a partir de uma experiência religiosa que constitui toda a sua especificidade. Esta experiência é relativa ao bem e ao mal na criação, singularmente no coração do homem. O tema principal da teosofia de Böhme é o confronto entre a luz e as trevas. É uma luta intensamente vivida e que não se resolve no modo da simples dialética. Se falarmos a linguagem do espírito moderno, diremos que a teosofia de Böhme não é nem uma metafísica nem uma filosofia. Ora, uma vez admitida a especificidade desta teosofia, não hesitaremos em chamá-la de uma psicologia //esotérica//. No entanto, a entenderemos segundo uma acepção que não será de modo algum "reducionista". Feuerbach escreve que, sem o saber, Böhme, o teósofo, é o mais profundo dos psicólogos. Isso é honrá-lo. Mas se reduzirmos a teologia à metafísica e a metafísica à psicologia, não é para mostrar a inanidade tanto da teologia quanto da metafísica? Ao mesmo tempo, não se arruína a credibilidade da psicologia, concedendo grande profundidade à de Böhme? Não a rebaixamos ao nível de um mero "psicologismo"? Não fazemos de Böhme o Monsieur Jourdain de uma psicologia perspicaz, é certo, mas demasiado humana? Quanto à palavra //esotérico//, não é depreciativa na pena de um filósofo moderno? Alguns a temeriam. No entanto, também não teremos medo de aplicá-la à obra de Böhme, mas dando-lhe um sentido bem definido. Os escritos de Böhme não apresentam nenhuma referência a um esoterismo institucional. A única instituição é a igreja visível, construída por mãos humanas. Ora, o plano próprio do mistério é o do invisível, que está oculto sob as aparências visíveis, exatamente como o homem espiritual, em nós, é envolto em carne vil. O santuário invisível está no próprio coração do templo de pedra. Está na própria pedra, pois Deus está presente nela. Não é uma instituição humana separada. Se há separação, é no interior que ela é efetiva. O mistério está em cada um de nós. Por isso, pode ora se fechar e ora se abrir. O próprio Deus, segundo Böhme, é ao mesmo tempo o mais secreto e perfeitamente manifesto. O que não é visível para os olhos do corpo terrestre, é para os do corpo espiritual de que se reveste a alma convertida a Deus. O reino de Deus está em nós, Böhme não se cansa de repetir. Ora, só aqueles de nós que têm o privilégio do despertar o percebem. Seria, portanto, vão querer provocar essa visão dirigindo-se a almas que não estariam de modo algum preparadas segundo o coração. Böhme o sabe perfeitamente e o prefácio escrito por ele para o primeiro dos textos apresentados neste volume é significativo a esse respeito. O autor não poderia ter escrito para homens que teriam para ver apenas os olhos do animal terrestre. Quando Böhme diz, por outro lado, que não se deve jogar pérolas aos porcos, ele assume a atitude do //esotérico// que se autoriza da fala de Jesus. No entanto, ele obedece a uma concepção que interioriza totalmente a iniciação aos mistérios. Há apenas um sumo sacerdote, que é o Espírito Santo. Se a obra de Böhme parece apresentar-se como uma iniciação, por um lado, ela se destina apenas a pessoas já despertas, nestes tempos dos primeiros //lampejos da aurora//, e por outro lado, seu autor, prevalecendo-se de uma vocação profética, se defende de fazer outra coisa senão transcrever. Imitando livremente a fala de Böhme, diríamos que a iniciação é dispensada ao fiel em uma //loja invisível// que é o templo da alma, morada do Espírito Santo. O desenrolar desta instrução e a maneira como ela é vivida, são da alçada da psicologia mística. Ora, o próprio da teosofia de Böhme é transpor para dentro da Divindade a teofania que ocorre no coração do homem. Deus se manifesta a si mesmo como se nos manifesta. A teologia mística tradicional recorda a promessa da primeira epístola aos Coríntios: conheceremos a Deus como somos conhecidos por ele. Böhme, por sua vez, poderia ter dito que Deus se conhece como é conhecido por nós. Há uma perfeita analogia entre a maneira como Deus se manifesta ao homem e aquela como ele se revela a si mesmo. A psicologia mística, cujo assunto é o nascimento de Deus em nós, torna-se uma psicologia //esotérica// aplicada a uma Divindade que só se torna verdadeiramente Deus ao se conhecer segundo o fundo que se constitui. Mas, dirá o leitor de Feuerbach, tudo isso não é apenas a projeção de uma experiência subjetiva, segundo a ideia que o filósofo materialista nos dá da essência da religião? Böhme projeta em Deus o que acontece ao homem. Ora, no mesmo texto que lhe consagra, Feuerbach o censura por postular Deus //a priori//, para dele derivar tudo o que se propõe ao nosso conhecimento. Isso é, diz o filósofo, uma maneira de contornar nossa ignorância humana: inventa-se Deus Pai de todas as coisas e alega-se que conhecer a Deus é conhecer tudo. Se seguirmos a crítica negativa de Feuerbach, veremos apenas uma inconsequência na abordagem de Böhme: depois de inferir do homem toda a verdade sobre Deus, o teósofo deriva todo o nosso saber de Deus. Mas aqui novamente, podemos levar ao pé da letra a afirmação de Feuerbach. Simplesmente a reinterpretaremos à luz dos escritos de Böhme. É bem verdade que para Böhme, é a alma que dá à luz Deus. Não é menos certo que a alma representa ela mesma a natureza emanada de Deus. Há no encontro dessas duas verdades infinitamente mais do que uma simples contradição. É um verdadeiro paradoxo, que o leitor de Böhme deve aprofundar se quiser compreender sua obra de outra forma que não para fazer dela o paradigma perfeito que serve para mostrar pela teosofia a vaidade de todo pensamento teológico, ou mesmo de toda metafísica. Deus se gera na alma que, antes de ser individualizada no nível da criação, é a natureza original. A descrição desta geração parece-nos apresentar os elementos de uma verdadeira psicologia das profundezas. Se não tivesse sido dado, sem dúvida pelos amigos de Böhme, às "Quarenta perguntas sobre a alma", é o título de "//Psychologia vera//" que teríamos escolhido para os textos reunidos neste caderno. Notemos que estas "Quarenta perguntas" foram traduzidas por Saint-Martin com as três obras aqui apresentadas. São contemporâneas e muito próximas no fundo. O título de "//Psychologia sacra//", cuja responsabilidade nos incumbe, gostaria de sugerir como a teosofia de Böhme procura //objetivar// a psicologia da revelação em um //sujeito primordial// que é Deus. A psicologia humana se eleva ao nível de uma psicologia divina. A teologia se torna o que podemos chamar de uma //psicosofia//. Mas o Deus de Böhme não é, por isso, o produto de uma fabulação gratuita. Mesmo que seja admitido que o homem se projeta nele, sua realidade não é menos coercitiva. Acima de tudo, não o transformemos em um //Deus ex machina// inventado pelo homem para a conveniência do espírito humano.