À maneira de um místico que é também um mestre escolástico – lembramos a observação de Heidegger no Habilitationsschrift sobre a unidade do misticismo e da escolástica na Idade Média – Eckhart nos fornece algumas provas da primazia do desapego. Assim, ele argumenta que o desapego é superior ao amor e à humildade. O amor é elogiado acima de todas as virtudes por São Paulo (1 Coríntios 13:1); mas para Meister Eckhart o desapego é ainda mais elevado que o amor. Pois pelo amor, diz, sou capaz de “sofrer todas as coisas por amor de Deus” (DW, V, 540/Cl., 161). Mas quando um homem suporta algo, ainda mantém uma relação com aquela coisa criada da qual vem o seu sofrimento. Já pelo desapego “não sou receptivo a nada além de Deus” (DW, V, 539/Cl., 161) e “completamente livre de todas as criaturas” (DW, V, 540/Cl., 161). O desapego torna a alma receptiva a nada além de Deus porque, ao se desapegar de tudo que é criatural, a alma se aproxima tanto de ser “nada” que apenas o próprio Nada, Deus, pode aí residir:
Mas o desapego está tão próximo do nada, que nada além de Deus é sutil e raro o suficiente para ser contido no desapego [no coração desapegado]. (DW, V, 540/Cl., 161)