A análise da condição de Filho fez aparecer nela três relações: a relação do ego consigo, sua relação com a Vida e a relação da Vida consigo mesma. E isso porque o ego não se relaciona consigo senão enquanto se relaciona com a Vida e não se relaciona com a Vida senão enquanto a Vida se relaciona consigo mesma. É no relacionamento da Vida consigo, com efeito, e somente nele, que o próprio ego se relaciona consigo. Este relacionamento, nos três casos, extrai sua essência da Vida: do Imemorial. Aí está por que este, que marca com seu traço indelével a relação da Vida consigo, marca do mesmo modo a relação do ego com a vida, sua geração e a relação do ego consigo mesmo, com o “si” do homem.
Comecemos por este. Se é na relação da Vida consigo que o ego se relaciona consigo mesmo, não é extraordinário constatar como uma prova decisiva da implicação e da natureza dessas diferentes relações que a dissimulação da relação da Vida consigo é identicamente a da relação [210] do ego consigo, a dissimulação do próprio ego? É em sua relação consigo, na sua própria Ipseidade, que o ego é invisível – ao mesmo título e que a Vida que gera esta Ipseidade e, assim, este ego. E, tal como o esquecimento em que se mantém a vida com respeito a si mesma – a vida incapaz de tomar lugar diante de seu próprio olhar, de pensar em si, de se lembrar de si – é insuperável, também o é o esquecimento que atinge a relação do ego consigo, com o “Si” deste ego.
Uma vez mais, as representações tradicionais do “eu” e do “si” são invertidas. Que o ego seja incapaz de pensar em si, e notadamente de se lembrar de si, aí está o que parecerá paradoxal se é verdade que pensar em si e lembrar-se de si ocupa a maior parte do tempo da maioria das pessoas. Mas que ego se apresenta a seu pensamento, de quem se lembram eles? Deste indivíduo empírico nascido em tal lugar, em tal momento, e que se debruça sobre seu espelho para contar suas rugas, lembrando-se do tempo em que seu rosto era liso. Mas tal indivíduo só existe na medida em que é percebido como um eu, e ele só é percebido como um eu com a condição de uma Ipseidade que não se mostra nunca no mundo, não advindo senão na vida invisível e como efetuação fenomenológica desta.