Cartas Abgaro Jesus

Apócrifos do Novo Testamento — CORRESPONDÊNCIA ENTRE ABGARO E JESUS,


Simbolismo
Ewa Kuryluk: Excertos de “Santa Verônica e o Sudário”

Na História da Igreja de Eusebius, o rei Abgar, um monarca bem sucedido, morrendo de uma doença incurável, ouvira falar de Jesus Cristo que, devido a seus milagres, “se tornou em todos os países objeto de conversas animadas e atraía grande número de pessoas de países estrangeiros bem distantes da Judeia” (1.13:1).

Esperançoso de um alívio, Abgar enviou um mensageiro a Jesus com uma carta na qual ele escreveu: “Eu… lhe imploro que venha até mim, sob qualquer circunstância, e cure a doença da qual sofro. Devo acrescentar que sei que os judeus o tratam com desprezo e desejam molestá-lo; minha cidade é muito pequena, mas bastante considerada, adequada para nós dois” (1.13:7-9). Jesus responde prometendo a Abgar que um de seus discípulos iria a Edessa curar o rei. Essa promessa é cumprida quando, após a ressurreição e ascensão de Cristo aos céus, o apóstolo Tomé (ou “Judas, também conhecido como Tomé”, 1.13.11) envia Tadeu, um dos setenta discípulos de Cristo, a Edessa.1

Na resposta de Jesus, as primeiras duas sentenças são particularmente significativas. Antes de começar a carta propriamente dita, Jesus enfatiza a importância da fé que pode agir sem as presenças. Na primeira sentença, “Felizes aqueles que acreditam em mim sem terem me visto!” (1.13:11), alude a Tomé (ou Tomé Judas, o Judas gêmeo), que não possui essa fé. Oito dias depois da ressurreição Cristo visita seus alunos, coloca o dedo de Tomé na ferida da lateral de seu corpo e escarnece do apóstolo incrédulo: “Você acreditou porque me viu? Abençoados aqueles que não me viram e mesmo assim acreditam” (João 20:29). A segunda sentença, “Está escrito, a meu respeito, que aqueles que me viram não acreditarão em mim, e aqueles que não viram acreditarão e viverão” (1.13:11) reforça o assunto, referindo-se ao Antigo Testamento, onde Deus fala a Isaías: “Se você não quisesse acreditar, com certeza não deveria ter confirmado”. (Is. 7:9). Assim Jesus primeiro elogia Abgar por confiar plenamente em palavras e só depois explica que está ocupado, completando sua missão na Terra e portanto não pode comparecer.

Na História da Igreja, a pequena carta de Jesus é seguida de um documento siríaco subjacente que descreve a chegada do apóstolo ao palácio de Abgar, uma cena memorável que introduz uma imagem: “No momento de sua entrada, uma visão maravilhosa surgiu para Abgar na face de Tadeu. Ao vê-la, Abgar curvou-se diante do apóstolo, e o espanto tomou conta de todos os espectadores; pois eles não tiveram essa visão, que surgiu somente diante de Abgar” (1.13:14-15). Então Tadeu colocou suas mãos sobre o rei e curou-o instantaneamente. Esse é o início da evangelização de Edessa: “Então Abgar instruiu seus cidadãos para que se reunissem ao raiar do dia e ouvissem a pregação de Tadeu… Tudo isso aconteceu no ano de 340” (1.13:21-2) da era Seleucida, cerca de 30 d.C., o ano provável da Ascensão.

A doença de Abgar não é especificada, mas sua designação de “Uchama” (negro) sugere que ele devia estar sofrendo de lepra, ou, mais precisamente, da “negra” ou, pelo contrário, da “lepra branca” — de acordo com a tendência per antiphra-sin de toda a mitologia em tratar os opostos como sinônimos. Nas versões posteriores da lenda a lepra é muitas vezes atribuída ao rei. Mas também o é a gota, uma doença provavelmente sugerida por Eusebius que menciona não somente a cura de Abgar, mas também de um certo “Abdus, filho de Abdus, que tinha gota” (1.13:18).

DOUTRINA DE ADDAI