Primeira Parte — A confusão do psíquico e do espiritual
Na primeira parte que trata da ilusão da caridade, foi preciso mostrar que efetivamente a caridade poderia se corromper e guardaria nela, de alguma maneira, seu próprio poder de cegueira. Borella achou por bem descrever esta ilusão como um confusão do psíquico e do espiritual, o calor da afetividade humana se atribuindo as virtudes da espiritualidade verdadeira. Esta confusão deu seu nome à primeira parte, e faz objeto do capítulo I, o capítulo II mostra que esta confusão é efetivamente realizada, e o capítulo III tira desta constatação uma lei psicodinâmica que permite compreender o fenômeno em toda sua generalidade.
Introdução
A caridade é uma virtude teologal, quer dizer que tem Deus por objeto. Mas sendo também uma virtude, ela tem o homem por sujeito. Convém portanto descrever em primeiro lugar as relações do homem e da caridade. Trata-se de uma espécie de fenomenologia da caridade onde esta virtude é apreendida em seu exercício espontâneo. Esta fenomenologia (ou descrição) faz claramente aparecer a possibilidade de sua corrupção. É preciso em seguida mostrar como esta possibilidade efetivamente se realizou hoje em dia, quer dizer como a consciência caritativa moderna se cega gravemente sobre sua verdadeira natureza. Trata-se aí de uma espécie de psicanálise da consciência caritativa. Estamos então em condições de abarcar a confusão do psíquico e do espiritual (ou do natural e do sobrenatural) que realiza a ilusão do amor, em sua amplitude. Pois ela não afeta somente as consciências individuais, mas também a sociedade cristã inteira: é a alma do cristianismo que perverte o teologal em sentimental em se auto-mutilando em uma paródia de sacrifício. Tendo perdido o sentido do sagrado transcendente, só encontra o sentimento de seu amor sacrificial se destruindo ela mesma. Trata-se aí de uma espécie de psicodinâmica da qual se pode formular as leis de uma maneira rigorosa.