Caminho da Alma

Adin Steinsaltz (Adin Even Yisrael)
Excertos de “A Rosa de Treze Pétalas”. Maayanot, 1992.

A alma do homem funciona através do seu instrumento ou recipiente, que é o corpo. Através dele e com ele, a alma pensa, percebe, sente e age; através dele e por ele, a alma tem de cumprir sua dupla função na realidade. Primeiro, tem de executar uma determinada tarefa no processo de aperfeiçoar o mundo externo, ou pelo menos essa parte do mundo à qual se destina. E, segundo, sua tarefa é elevar-se. Mas essas tarefas não são necessariamente separadas; elas são cumpridas simultaneamente, porque o mundo físico contém em si mesmo uma essência maior, forças superiores nas quais, apesar de escondidos e distorcidos, existem elementos da informidade divina original. É com essas forças superiores que a alma, em seu trabalho de Tikkun, ou correção, é unida; e assim elevando uma porção do mundo, também ela é elevada e levantada. A relação entre corpo e alma, e de modo geral entre o espírito das coisas e sua corporeidade, pode ser expressa pelo exemplo de um cavaleiro sobre um cavalo. Um cavaleiro que mantém o controle e guia seu cavalo pode ir muito mais longe do que poderia ir a pé. Então, como é adequada a imagem do Messias como um homem pobre montado num burro para descrever a condição humana; a faísca divina conduzida e guiando, o burro físico suportando e esperando por liderança e poder.

O caminho de Tikkun, o curso planejado para a estada da alma no mundo, é geralmente achado na Torá, que se supõe seja um instrumento guia. Porque a Torá não é apenas uma revelação mais alta; é um guia prático para dirigir o homem em seu caminho, mostrando-lhe o que fazer e como fazê-lo, em sua tarefa de consertar o mundo. Dentro desse curso geral de tarefa de elevar o nível do universo, cada alma tem de achar seu próprio caminho particular, seu próprio lugar, e os objetos específicos relativos à sua existência. Portanto, foi dito que cada uma das letras da Torá tem sua alma correspondente; ou seja, cada alma é uma letra em toda a Torá, e tem sua própria função a ser cumprida. A alma que cumpriu sua tarefa, que fez o que tem de fazer em termos de criar ou consertar sua própria parte do mundo e realizar sua própria essência, pode esperar, após a morte, pela perfeição do mundo como um todo. Mas nem todas as almas são privilegiadas assim: muitas se perdem, por uma razão ou outra; às vezes uma pessoa não faz todas as coisas corretas, e às vezes utiliza suas forças de maneira errada e estraga sua porção e a porção dos outros. Nesses casos, a alma não completa a sua tarefa, e pode até ficar danificada no contato com o mundo. Ela não conseguiu completar essa porção de realidade que somente esta alma particular pode completar; e portanto, após a morte do corpo, a alma retorna e é reencarnada no corpo de outra pessoa, e de novo, tem de tentar e completar o que deixou de corrigir ou o que danificou no passado. Os pecados do homem não são eliminados, até que esta alma não complete o que precisa completar. Disso podemos ver que a maioria das almas não são novas, não estão no mundo pela primeira vez. Quase cada pessoa carrega a herança de existências anteriores. Geralmente, não se obtém o eu anterior novamente, porque a alma se manifesta em diferentes circunstâncias e em diferentes situações. Mais ainda, algumas almas se compõem de mais que uma única pessoa anterior, e compartilham partes de várias pessoas. Uma grande alma, geralmente, reencarna-se não num único corpo, mas se ramifica, participando de várias pessoas, cada uma das quais tem de satisfazer diferentes aspectos da existência. Apesar desta complexidade incalculável, a alma estará formada pelos mesmos elementos constitutivos, e terá de completar essas tarefas incompletas deixadas pelo ciclo anterior. Portanto, o destino de uma pessoa está ligado não somente com as coisas que ele próprio cria e faz, mas também com o que acontece à alma em suas encarnações anteriores. Os encontros e eventos da vida, suas alegrias e suas penas, são influenciados pela existência anterior de cada um. A existência de uma pessoa é uma continuidade, a sustentação de uma determinada essência fundamental; e certos elementos que parecem não pertencer ao presente podem subir até a superfície, e a pessoa tem de completá-los ou consertá-los ou corrigi-los — uma porção do mundo que é sua tarefa colocar em ordem, para elevar sua alma até seu nível correto.

E esta luta das almas também é a luta e o caminho do mundo para a sua redenção. Quando as almas voltam e lutam para corrigir o mundo e justificar-se, num certo nível deste Tikkun geral ou correção, elas atingem seu pico máximo. Então os maiores obstáculos ficam atrás da raça humana, e esta pode prosseguir para a sua perfeição com passos seguros e sem a herança do sofrimento herdada de existências anteriores e pecados anteriores — este é o começo da salvação, que é o tempo do Messias. Dessa maneira, o homem segue até que esse estágio seja atingido, quando todas as almas voltam, cada uma para o seu próprio eu, quando cada eu no mundo entrará numa nova vida em completa fusão com as forças superiores da alma em todos os níveis e no corpo, manifestando todos os poderes potenciais que contém. Este nível da perfeição de toda a humanidade, no qual existirá uma nova relação entre corpo e alma, e o mundo será um todo nele mesmo, é chamado “Paraíso” ou o “próximo mundo”. É a meta para a qual todas as almas dos homens, ao desempenhar suas tarefas privadas e específicas na vida, aspiram e lutam.