Bazan Valentino

García Bazán — Valentino
Segundo Bazan, com o sistema valentiniano temos o exemplo mais evidente para ratificar os carácteres que afirmamos como peculiares do mito gnóstico. Segue a tentativa de resumo do mito de Sophia, como apresentado por Bazan em seu livro “Gnosis”.

Segundo a notícia de Irineu de Lião, comparada com o informe de Hipólito:
Na origem…
*Na origem se encontra também o Deus Supremo, Princípio, Pré-Pai, Pai, Abismo ou Pré-Princípio. Sues atributos o caracterizam como incompreensível, inabordável, invisível, eterno, ingênito, tranquilo e em repouso profundo.
**Com ele coexiste o Pensamento, também chamado Silêncio e Graça (em Hipólito, com os mesmos atributos, mais o de “fecundo”; porém só, sem companhia)
**Desta parelha, na realidade um ser, saem por emissões sucessivas e kata syzigian, sucessivos pare de Eones (vide aion): Inteligência, Verdade; Logos, Vida; Homem, Igreja; “com vistas a glória do Pai”.
**Esta primeira encarnação com o Princípio forma a Ogodoada, depois seguem as emissões (em Hipólito, dez de Inteligência-Verdade, e doze de Logos-Vida).
**Logos e Vida emitem dez, Homem e Igreja, doze: 8 mais 10 mais 12 = 30, que forma um todo completo, o Pleroma (em Hipólito são 28, pois não se conta o Pai, o número 30 se completa com o Cristo e o Espírito Santo).
**Só a a Inteligência — Monogenos — contempla o Pai, isso lhe dá enorme deleite; os demais Eones têm esse desejo em forma tranquila (Hipólito não assinala este detalhe). Desta maneira expõe-se as características míticas da Divindade Suprema e a subsequente emanação.

Queda.
*O Éon 30, Sophia, tem o mesmo desejo — Intenção — dos demais Eones, mas de forma desordenada já que não tão moderada, e seu impulso a leva a querer compreender a grandeza infinita do Pai, e essa desordem é uma alteração profunda, uma “paixão”: desordem e sofrimento, que a impulsionava cada vez mais adiante, de tal maneira que ia assimilar-se com a suavidade do Pai, a dissolver-se no Pleroma.
**Mas o Limite (um Éon especial, emitido sem companheira pelo Monogenos) a salvou. Essa Potência afirmou ao conjunto e o conservou fora da Grandeza Inexpressável, (Hipólito mostra a capacidade engendradora do Pai observada por Sophia e que ela quis imitar-lhe por si só, ignorava que isto era privativo do Pai, Princípio e Raiz do todo).
**Sophia é então, retida, afirmada, convertida e persuadida de que o Pai é incompreensível. Razoavelmente abandona sua Enthymesis e a paixão consecutiva, pois foi salva, justificada e separada pelo Limite — Cruz.
**A Intenção é crucificada e separada de Sophia, finalmente restaurada em sua syzygia. O separado é substância espiritual, pois é o impulso de um Éon, mas informe e sem espécie, fruto somente do feminino (para Hipólito, Sophia emitiu a substância sem forma nem organização, um aborto).
**Também Sophia é Terra prometida, a Jerusalém celeste onde entram os “filhos de Israel”, ou seja, os eleitos da gnose.
**Apareceu, pois, a ignorância turbando ao Pleroma, a dor de Sophia, o rogo dos demais Eones e a emissão do Limite. Este também recebe, como dito, o nome de Cruz, Redentor, o que paga o resgate, o que libera, o que absolve, delimita, guia e reintegra. Cruz-Limite, tem sobretudo a dupla virtude eficaz da Cruz: afirma e delimita ou purifica, ao consumir o elemento Hylico e reunir o purificado.
**O Monogenos emite uma nova parelha, para que não se repita outra paixão semelhante por parte dos demais Eones: Cristo e o Espírito Santo.
***O primeiro instruirá ao Pleroma, igual como o Cristo terrestre. Assim revela a gnose, ensina a índole da syzygia e sobretudo participa da “gnose do Pai”, ou seja, que o Pai é incompreensível, inacessível, e que ninguém o pode ver ou entender, senão por meio do Unigênito”, em uma palavra, a mesma gnose que convenceu a Sophia.
***E por outra parte, a transcendência incompreensível do Pai explica a não perdurabilidade dos Eones e o compreensível do Pai, o Filho, a causa de seu nascimento e formação (em Hipólito são os Eones os que rogam ao Pai a emissão da nova díada, para separar ao aborto e consolar a Sophia).
**O Espírito Santo vai ter uma função de nivelação, unidade e harmonia, por isso, de tranquilidade e gozo na ação de graças. Igualdade que está referida aos sexos.
**O conjunto consolidado em repouso perfeito, canta seus hinos de júbilo ao Pré-Pai (Hipólito fala também desta paz e alegria). E isto na unidade do Espírito — franco clima de gnose —.
**Então quando cada um dos Eones pondo o que possui de mais esquisito, como uma só vontade e para a glória do Pai, emitem um novo ser, o “Fruto Perfeito”, Jesus (em Hipólito sucede algo semelhante, mas glorificando ao Pai por meio do Filho) cujos nomes são também Salvador, Cristo e Logos e do nome de seu Pai, Todo. Ele, em honra dos Eones, emite aos anjos salvadores. Sua função fora do Pleroma será fundamental.

O Pneuma caído.
*De Sophia se separou sua Intenção (Enthymesis), misturada de paixão. A operação sobre ela será pois dupla, a primeira é uma formação que se realiza em dois tempos “segundo a substância” e “segundo a gnose”. A Intenção / Achamoth se agitou no vazio. Estava fora do Pleroma e era informa e sem espécie, como um aborto, já que Sophia não havia conhecido varão. Mas o Cristo tem piedade dela. Se estende sobre a Cruz e “forma” com sua potência a esta Sophia, formação de substância e não de gnose. Depois o retirou sua potência com o objetivo de que esta Sophia de baixo se desse conta da paixão que albergava excluída do Pleroma, e aspirasse ao superior, deixando, além do mais, sobre ela certo aroma de incorruptibilidade, proveniente do Cristo e o Espírito Santo (em Hipólito, Cristo-Espírito Santo, separam ao aborto, Cristo formou uma Sophia exterior, Éon Perfeito, capaz de Chegar a ser igual aos Eones do Pleroma).
**Formada e consciente Sophia, foi abandonada pelo Logos ou Cristo. Então buscou a Luz que a havia abandonado, o Limite a detém, dizendo Iao — esta é a origem de seu nome —.
**Não podendo atravessar o Limite, e formada substancialmente, foi enevoada por todos os tipos de paixões, tristeza, temor e angústia; mas, diferentemente da Sophia pleromática não suporta a alteração, mas aceita a luta de contrários; se “converte” (vide strepho)até quem a havia vivificado e dali se separam as substâncias da matéria de que está formado nosso mundo.
***Cada paixão chega a ser uma substância: as lágrimas, as águas, a luz, etc…
**Os nomes de Sophia são: Sophia (Hipólito a chama Sophia de fora, como exterior ao Pleroma); Espírito Santo; Pneuma — já que será depois a mãe dos pneumáticos; Segunda Ogdoada, o que expressa sua relação profunda com o Pleroma, por ser uma natureza pneumática; também se denomina Terra, Jerusalém, Mãe, Senhor, Intenção e Achamoth (estes últimos nomes não aparecem em Hipólito).
**Continuando com a formação segundo a gnose, o papel fundamental é o do Salvador.
***Quando Sophia subia até o alto foi enviado o Paracleto ou Salvador a quem o Pai e conjuntamente todos os Eones deram uma total virtude.
***Foi enviado até ela com seus anjos e quando Achamoth o viu por reverência, se cobriu com um véu, depois ao olhá-lo, ele e seus anjos correram até Sophia e recebeu uma “virtude”: a formação de gnose e cura das paixões.
***Mas como já dito, estas não podiam desaparecer, o Salvador as separou e misturou e a paixão incorpórea se transformou em matéria incorpórea, depois o outorgou atitude e natureza, para poder formar corpos combinados.
***Houve, desta maneira duas substâncias, uma má e outra possível de conversão. Por isto chamam o Salvador, “demiurgo em potência”.
**Achamoth, livre de sua paixão,vendo aos anjos, ficou prenhe de tal visão e concebeu “frutos” a sua imagem, concepção espiritual a semelhança dos “servidores” do Salvador.
**Temos assim pois, uma tripla distinção: uma substância espiritual, surgida por concepção direta de Sophia, uma material, má, saída das paixões e uma “passível”, psíquica, a da conversão.

O Demiurgo.
*O demiurgo separa o “passível” do material. Aquele provém da conversão, a matéria das três paixões.

Pneuma no mundo e dualismo.
*Uma vez feito o mundo, o demiurgo fabricou o homem. Em primeiro lugar o hylico ou terrestre, retirado da matéria invisível e a esta forma insuflou o homem psíquico, “a sua imagem e semelhança”. Depois o envolveu com uma túnica de pele, o elemento carnal; mas Achamoth contemplando aos anjos do Salvador concebeu o que lhe consubstancial, o pneumático, secretamente o pois no demiurgo e desta forma, sem sabê-lo, o fez penetrar no homem hylico e psíquico, naquelas almas que são as “justas”, “boas por natureza”.

Salvador.
*O Cristo evangélico é um caso privilegiado da união das duas substâncias.

Retorno.
*Enquanto chegue a consumação do mundo, o demiurgo exerce sua função na “economia” do cosmo inferior.