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Pela preguiça se enfraquece o teto, e pela frouxidão das mãos a casa tem goteiras. (Ecc 10:18)
A. Tanquerey – Compêndio de Teologia Ascética e Mística
§ III. A preguiça
883. A preguiça é um vício anexo à sensualidade, porque vem, afinal, do amor do prazer, enquanto este nos leva a evitar o esforço ou o incômodo. Há, efetivamente, em todos nós uma tendência ao menor esforço, que nos paralisa ou diminui a atividade. Exponhamos: 1. a sua natureza; 2. a sua malícia; 3. os seus remédios.

884. 1. Natureza. A) A preguiça é uma tendência à ociosidade ou ao menos à negligência, ao torpor na ação. Às vezes é uma disposição mórbida que vem do mau estado da saúde. As mais das vezes, porém, é uma doença da vontade, que teme e recusa o esforço. O preguiçoso quer evitar qualquer trabalho, tudo quanto lhe pode perturbar o sossego e arrastar consigo fadigas. Verdadeiro parasita, vive, quanto pode, a expensas dos outros. Manso e resignado, enquanto o não inquietam, impacienta-se e irrita-se, se o querem tirar da sua inércia.

B) Há graus diversos na preguiça a) O desleixado ou indolente não se move para cumprir o seu dever senão com lentidão, moleza e indiferença; tudo o que faz, fica sempre mal feito, b) O ocioso não recusa absolutamente o trabalho, mas anda sempre atrasado, vagueia por toda a parte sem fazer nada, adia indefinidamente a tarefa de que se encarregara, c) O verdadeiro preguiçoso, esse não quer fazer nada que fatigue, e mostra aversão pronunciada para qualquer trabalho sério do corpo ou do espírito.

C) A preguiça nos exercícios de piedade chama-se acedia: é um certo fastio das coisas espirituais que leva a fazê-las desleixadamente, a encurtá-las, e até às vezes a omiti-las por vãos pretextos. É a mãe da tibieza, de que falaremos a propósito da via iluminativa.

885. 2. Malícia. A) Para compreendermos a malícia da preguiça, cumpre-nos recordar que o homem foi feito para o trabalho. Quando Deus criou o nosso primeiro pai, pô-lo num paraíso de delícias, para que nele trabalhasse: «ut operaretur et custodiret illum» 1. É que, efetivamente, o homem não é, como Deus, um ser perfeito; tem numerosas faculdades que, para se aperfeiçoarem, necessitam de operar: é pois, uma exigência da sua natureza trabalhar para cultivar as potências, prover às necessidades do corpo e alma, e tender assim para o seu fim. A lei do trabalho precede, pois, a culpa original. Mas, depois que o homem pecou, tornou-se para ele o trabalho não somente uma lei da natureza, senão também um castigo, isto é, tornou-se penoso, como meio que é de reparar a sua falta. Com o suor do rosto havemos de comer o nosso pão, tanto o pão da inteligência como o pão que nos alimenta o corpo: «in sudore vultus tui vesceris pane».

Ora, a esta dupla lei, natural e positiva, é que o preguiçoso falta; comete, pois, um pecado, cuja gravidade se mede pela gravidade dos deveres que descura. a) Quando chega a omitir os deveres religiosos necessários à própria salvação, há falta grave. O mesmo se diga, quando despreza voluntariamente, em matéria importante, algum dos seus deveres de estado. b) Quando este torpor o não leva a descurar senão deveres, religiosos ou civis, de menor importância, não passa de venial o pecado. Mas a ladeira é resvaladia; se não se luta contra a negligência, não tarda esta em se agravar, tornando-se mais funesta e culpável.

886. B) Quanto à perfeição, é a preguiça espiritual um dos obstáculos mais sérios, por causa dos seus funestos resultados.

a) Torna-nos a vida mais ou menos estéril. Pode-se «efetivamente, aplicar à alma o que a S. Escritura diz do campo do preguiçoso:

«Passei perto do campo dum preguiçoso,
e perto da vinha dum insensato.
E eis que os espinhos ali cresciam por toda a parte,
as silvas cobriam-lhe a superfície,
e o muro de pedra estava por terra…
Um pouco de sono, um pouco de sonolência,
um pouco cruzar as mãos para dormir,
e a tua pobreza virá como um vagabundo
e a tua indigência como um homem armado»

É exatamente o que se encontra na alma do preguiçoso: «m lugar das virtudes, são os vícios que lá crescem, e os muros, que a mortificação tinha elevado para proteger a virtude, caem pouco a pouco, preparando o caminho à invasão do inimigo, isto é, do pecado.

887. b) Dentro em breve, efetivamente, se tornam mais veementes e importunas as tentações: «porque a ociosidade ensinou muito mal, multam malitiam docuit otiositas». Foi ela que, com o orgulho, perdeu Sodoma: «Eis qual foi o crime de Sodoma: o orgulho, a abundância e o repouso sem cuidados em que vivia com suas filhas». É que, na verdade, o espírito e o coração do homem não podem estar inativos: se não se absorvem no estudo ou em qualquer outro trabalho, são logo invadidos por um sem-número de imagens, pensamentos, desejos e afetos; ora, no estado de natureza decaída, o que domina em nós, quando não reagimos contra ela, é a tríplice concupiscência (pleonexia, epithymia) ; serão, pois, pensamentos sensuais, ambiciosos, orgulhosos, egoístas, interesseiros, que tomarão o predomínio em nossa alma, expondo-a ao pecado.

888. C) Não é, pois, somente a perfeição da nossa alma que está aqui em jogo, mas até a sua eterna salvação. Porque, além das faltas positivas em que nos faz cair a ociosidade, só o fato de não cumprirmos os nossos deveres importantes é causa suficiente de reprovação. Fomos criados para servir a Deus e cumprir os nossos deveres de estado, somos operários enviados por Deus para trabalhar na sua vinha. Ora o Senhor não exige somente aos obreiros que se abstenham de fazer mal; quer que trabalhem. Por conseguinte, se, sem cometermos atos positivos contra as leis divinas, cruzamos os braços, em vez de trabalharmos, não nos há de o Senhor exprobrar, como aos obreiros, a nossa ociosidade: «quid statis tota die otiosi?» A árvore estéril, só pelo fato de não produzir fruto, merece ser cortada e lançada ao fogo: «omnis arbor, quae non facit fructum bonum, excidetur et in ignem mittetur».