O perdão parte do reconhecimento que o que quer que se pense, se imagine, se sinta, se perceba, de algo, de uma situação ou de uma pessoa, não passa de um pensamento, uma imagem, um sentimento, uma sensação, uma percepção. Como tal, só se dá apenas como um pensamento, uma imagem, um sentimento, uma sensação, uma percepção. Como tal, não pode ameaçar, afetar, atingir, ferir, destruir, denegrir, … Como tal, é possível per-doar, “dar-por-si-mesmo”, “deixar-ser o que assim é”, sem julgamento, sem condenação, sem remorso – mágoa, sem ressentimento; ou seja, sem o que resulta da provocação decorrente da interferência dos pensamentos, das imagens, dos sentimentos, das sensações, das percepções; ou seja, pondo um fim a qualquer sofrimento inútil ou tornando-o sofrimento-voluntário.
O per-dão não afirma o pecado para então perdoá-lo. “Por-minha-parte-se-dão” (per-dão) situações, eventos, acontecimentos, em resumo, atos e fatos, que efetivamente não são absolutamente conformes a meus pensamentos, imagens, sentimentos, sensações e percepções. O perdão é dirigido à dissolução destas “inconformações”, destes erros, destes sofrimentos.
O perdão se dá na quietude, e na quietude nada faz. Não afeta nenhum aspecto da realidade, não busca ajustá-la às aparências que agradem. Apenas observação – observa e esperança – espera, sem julgamento. Aquele que não perdoa, deve julgar para justificar seu não perdoar. Aquele que perdoa começa por perdoar a si mesmo, aceitar os logismos – pensamentos, imagens, sentimentos, sensações e percepções que se oferecem, nos atos e fatos que é chamado a experienciar, acolhe a verdade exatamente como ela é ser.
Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento
aphiemi = “deixar”, “soltar”, “cancelar”, “remir”, “perdoar”; aphesis = “desobrigação”, “perdão”, “cancelamento”; paresis, “remissão”, “não levar em conta”.
aphiemi (derivado de apo, “a partir de”, e hiemi, “por em andamento”, “enviar”), atestado desde Homero, significa a soltura voluntária de uma pessoa ou coisa sobre a qual alguém tem controle legal ou real. Além do vb., o sub. aphesis, “soltura”, “livramento”, é empregado de Platão em diante. No seu emprego fig., aphiemi coincide parcialmente com pariemi (Homero), lit. “deixar cair”, “deixar passar”, fig. “deixar passar”, “permitir” (o subs. paresis, de Hipócrates em diante), quanto ao sentido.
aphiemi é usado no Gr. clássico, tanto num sentido literal como no figurado:
(a) Com um objeto pessoal, “enviar para longe”, “mandar embora” (de uma mulher, “divorciar”; de uma reunião, “dissolver”, “terminar”), “deixar ir”, “partir”, “despachar”; com um objeto impessoal, “soltar” (e.g. um navio para o mar), “desfechar” (e.g. flechas”), “abrir mão de”.
(b) No sentido fig., o vb. significa “deixar sozinho”, “permitir”, “deixar passar”, “negligenciar”, “abandonar” (os cuidados, etc.); em Josefo, Ant., 1, 12, 3, “perder a vida”, “morrer”. O emprego jurídico é importante: “desobrigar de um vínculo legal” (cargo, culpa, etc. e, também, urna mulher do casamento, e.g. Hdt., 5, 39), “absolver” (e.g., o cancelamento de processo criminoso, Platão, Leis, 9, 86, 9d), “isentar” (de culpa, obrigação, castigo, etc.; e.g. Hdt., 6, 30). De modo semelhante, o sub. aphesis (e.g. Demóstenes, 24, 25) significa “desobrigação”, “perdão” ou “remissão”, etc. Todos estes significados se aplicam, de Homero em diante, apenas a relacionamentos humanos; não se acham num sentido religioso.
2. O mesmo sentido fig. se acha frequentemente juntamente com pariemi, “deixar-passar”, “relaxar” (e.g. afrouxar urna vela, Platão, Leis, 11, 931d); também significa, porém, “deixar ir sem castigo”, “permitir”, no sentido de brandura ou indulgencia pessoal (e.g. Hdt., 7,169,2), e o sub. cognato paresis, “deixar passar”.