Amônio de Alexandria (séc. VI)

Excertos de Guillermo Fraile e Juvenal Savian Filho

Foi filho de Hermias de Alexandria, este que foi discípulo de Siriano e que em seu comentário ao Fedro seguia o método alegórico da escola de Atenas. Amônio frequentou a escola de Proclo em Atenas, junto com seu irmão Heliodoro e sua mãe Edésia. Se interessou pelas matemáticas e a astronomia, e foi em Alexandria mestre de Damáscio, Simplício e Asclépio de Tralles, este último que comentou os livros I-VII da Metafísica de Aristóteles. Amônio foi também mestre de Olimpioro o Jovem, Teodoto e Filopón. Amônio é reconhecido principalmente por seus comentários das Categorias de Aristóteles, dos Primeiros Analíticos e das Perihermeneias. Tratou de conciliar a providência e a liberdade contra o fatalismo dos estoicos.

Amônio encarou sua tarefa de filósofo mais como um trabalho de comentador e conservador da tradição do que de inventor de posições filosóficas originais. Assim, sua concepção do cosmo é fundamentalmente neoplatônica, mas a característica principal de seu trabalho acadêmico (assim como a do conjunto da escola de Alexandria, no século que seguiu à sua morte) foi a especialização na filosofia de Aristóteles. Com efeito, praticamente todo o magistério público de Amônio consistiu em comentar as obras de Aristóteles, acima de tudo suas obras lógicas, tomando a Isagoge de Porfírio como introdução. Isso fez que a filosofia escolar de Alexandria assumisse, no século VI, um caráter eminentemente cientifico-técnico (as principais discussões referiam-se aos elementos e corpos celestes, aos mecanismos da sensação e do conhecimento, às regras do argumento etc.) e se distanciasse das especulações eminentemente religiosas e místicas sobre Deus e o destino humano, como se encontram nas obras de filósofos atenienses como Proclo, por exemplo.

Sem pretender, aqui, prolongar essas complexas e controversas discussões históricas, parece útil, entretanto, evocar a tese segundo a qual foi o caráter aristotélico que permitiu à escola de Alexandria sobreviver tanto sob o governo cristão local e imperial do século VI, como sob seu sucessor muçulmano. Em nenhum dos dois casos o trabalho alexandrino pareceu atentar contra a ortodoxia da religião, e parece que Damásio Diódoco, filósofo ateniense rival de Amônio, sempre se referia ao “negócio” de um certo mestre alexandrino com o bispo cristão do local que lhe permitia continuar ensinando. Se isso é verdade, seria possível imaginar que Amônio tenha feito alguma concessão e alterado algo de seus cursos? Isso parece pouco provável, mas, de toda maneira, é certo que os cristãos pareciam sentir-se à vontade para assistir às suas aulas1. Além disso, vale dizer que, embora não haja nenhuma evidência de uma possível conversão de Amônio ao cristianismo, é bem possível, entretanto, que seus sucessores, no último quarto do século VI, tenham sido cristãos. A propósito, João Filopón, que foi seu melhor aluno e editor de seus textos, era um monofisista estrito.


  1. É Zacarias de Mitilene quem registra um grande número de cristãos entre os alunos de Amônio.