Tomás de Aquino — Summa theologica I, q. LXXV, art. 5
A ALMA NÃO ESTÁ COMPOSTA DE MATÉRIA E FORMA
A alma não tem matéria, e isto se pode provar de duas maneiras. Primeiramente, pela natureza da alma em geral. Porque é próprio da natureza da alma ser forma de um corpo. Ora, ou o é segundo todo seu ser, ou o é só em parte. Se é segundo todo seu ser, é impossível que uma parte sua seja matéria, visto que a matéria é um ente que só em potência, e a forma, enquanto forma, é ato; e aquilo que está só em potência não pode ser parte de um ato, já que a potência repugna ao ato, como seu oposto. E se é forma somente segundo parte de seu ser, diremos que esta parte é a alma, e que aquela matéria, de quem é ato primeiro, é o primeiro animado.
Em segundo lugar, pela natureza da alma humana, em especial enquanto é intelectiva. Pois é evidente que tudo o que é recebido em um ser, o é à maneira do ser que recebe; assim, cada coisa é conhecida segundo esteja sua forma no sujeito que conhece. E a alma intelectiva conhece uma coisa em sua natureza absoluta; por exemplo, a pedra enquanto é pedra de um modo absoluto. Assim, pois, a forma da pedra se acha absolutamente, segundo sua própria razão formal, na alma intelectiva, e a alma intelectiva, portanto, é forma absoluta, e não uma coisa composta de matéria e forma. Porque se a alma intelectiva fosse composta de matéria e forma, as formas das coisas seriam recebidas nela como individuais, e deste modo só poderia conhecer o singular, como acontece nas potências sensitivas, que recebem as formas das coisas em um órgão corporal, desde que a matéria é o princípio de individuação das formas. Tem-se como resultado, pois, que a alma intelectiva e toda substância intelectual que conhece as formas de um modo absoluto não está composto de matéria e forma.