Abade Poimem 2

Apoftegmas — Abade Poimém

Tradução do grego de D. Estevão Bettencourt O.S.B.

21. O Abade José propôs ao Abade Poimém a mesma pergunta. Este respondeu: «Se alguém lança uma cobra e um escorpião no mesmo recipiente e fecha a este, não resta dúvida de que morrerão com o tempo; assim também os maus pensamentos: suscitados pelos demônios, desaparecem pela paciência».

22. Um irmão foi ter com o Abade Poimém e disse-lhe: «Semeio o meu campo, e com os seus frutos pratico a caridade». Respondeu o ancião: «Fazes bem». O irmão saiu então animado, e multiplicou as suas esmolas. Ora o Abade Anube ouviu contar isto, e perguntou ao Abade Poimém: «Não temes a Deus, pois que assim falaste ao irmão?» O ancião calou-se. Dois dias depois, porém, mandou chamar o irmão e perguntou-lhe em presença do Abade Anube: «Que me disseste o outro dia? Minha mente estava em outro lugar». O irmão respondeu: «Disse que semeio o meu campo e com os seus frutos pratico a caridade». O Abade Poimém observou: «Julguei que falavas de teu irmão que vive no século; se és tu que o fazes, digo-te que isto não é coisa de um monge». Ao ouvir isto, o irmão entristeceu-se e replicou: «Não sei fazer outro trabalho senão este; não posso não semear o meu campo». Depois, então, que o irmão se retirou, o Abade Anube se prostrou diante de Poimém e disse-lhe: «Perdoa-me». E o Abade Poimém explicou: «Também eu, desde o início, sabia que essa tarefa não é própria para um monge, mas falei de acordo com as disposições dele, e, com isto, animei-o a progredir na caridade. Agora, porém, ele se foi abatido, e, não obstante, tornará a fazer o mesmo».

23. Disse o Abade Poimém: «Se o homem pecar e o negar, dizendo: ‘Não pequei’, não o acuses, pois lhe cortarias o ânimo. Se, ao contrário, lhe disseres: ‘Não percas ânimo, irmão, mas guarda-te para o futuro’, excitarás a sua alma à penitência».

24. Disse mais: «Boa coisa é a experiência, pois ela ensina ao homem honesto».

25. Disse ainda: «O homem que ensina, mas não pratica o que ensina, é semelhante a uma fonte, pois a todos oferece com que beber e se lavar, mas a si mesma não pode purificar».

26. Certa vez, quando o Abade Poimém andava pelo Egito, viu uma mulher sentada junto a um túmulo, a qual chorava amargamente. E disse: «Ainda que venham todos os deleites deste mundo, não lhe tirarão a alma da tristeza em que se acha. Assim também o monge deve sempre trazer a tristeza em si mesmo» (NT: Isto é, a grande dor de ter pecado).

27. Disse mais: «Há o homem que parece calado, mas cujo coração condena a outros; esse tal está sempre a falar. E há outro homem que fala da manhã à noite, mas guarda o silêncio, isto é, nada diz que não seja de edificação».

28. Um irmão foi ter com o Abade Poimém e disse-lhe: «Abade, tenho muitos maus pensamentos, e corro perigo por causa deles». O ancião levou-o ao ar livre e disse-lhe: «Dilata os pulmões e detém os ventos». O irmão respondeu: «Não o posso fazer». Continuou o ancião: «Se não o podes fazer, também não podes impedir que os pensamentos venham; mas está em teu poder resistir a eles».

29. Disse o Abade Poimém: «Se três se reúnem, dos quais um leva dignamente uma vida tranquila, o outro é doente e dá graças a Deus, o terceiro faz o seu serviço com mente pura, esses três realizam um só e idêntico grau de virtude».

30. Disse também: «Está escrito: ‘Como o cervo deseja as fontes das águas, assim minha alma deseja a Vós, Deus’ (Sl 41,2). Ora os cervos no deserto, devoram muitas serpentes; a seguir, quando o veneno os faz arder de sede, desejam chegar-se às águas; e, ao beberem, refrescam-se, livrando-se do veneno das serpentes. Assim também os monges, morando no deserto, são queimados pelo veneno dos maus demônios, e desejam o sábado e o domingo para se chegarem às fontes das águas, isto é, ao Corpo e ao Sangue do Senhor, a fim de se purificarem da amargura do Maligno».