Abade Poimem 1

Apoftegmas — Abade Poimém

Tradução do grego de D. Estevão Bettencourt O.S.B.

11. Certa vez o presbítero de Pelúsio ouviu, a respeito de certos irmãos, que eles iam continuamente à cidade, se lavavam 1 e se descuidavam da própria alma. Em consequência, por ocasião da assembleia litúrgica, retirou-lhes o hábito monástico. Depois disto, porém, seu coração o acusou, e, arrependido, foi ter com o Abade Poimém, como que embriagado em seus pensamentos, tendo nas mãos as túnicas dos irmãos, contou o caso ao ancião. Este perguntou-lhe então: «Não tens tu algo do homem velho? Será que já o despiste?» O presbítero confessou: «Participo ainda do homem velho». Continuou o ancião: «Eis, portanto, que tu és como os irmãos. Pois, se participas, embora pouco, do que é velho, também tu estás sujeito ao pecado». Então o presbítero se foi, chamou os irmãos, e pediu-lhes desculpas (eram onze); a seguir, revestiu-os do hábito monástico e despediu-os.

12. Um irmão disse ao Abade Poimém: «Cometi um grande pecado, e desejo fazer penitência durante três anos». Respondeu o ancião: «É muito». Os que estavam presentes disseram então: «E durante quarenta dias?» Mais uma vez replicou o ancião: «É muito». E acrescentou: «Digo que, se o homem se arrepende de todo o coração e não torna a cometer o pecado, Deus o recebe já após três dias».

13. Disse também: «O sinal do monge se manifesta nas tentações».

14. Disse ainda: «Como o espadário do rei a este assiste, pronto em todo tempo, assim é preciso que a alma esteja pronta diante do demônio da fornicação».

15. O Abade Anube interrogou o Abade Poimém a respeito dos pensamentos impuros que o coração do homem gera, e a respeito dos vãos desejos. O Abade Poimém respondeu: «Gloriar-se-á o machado sem aquele que o manuseia? (Is 10,15) Também tu não dês a mão a eles e serão frustrados» 2.

16. Disse de novo o Abade Poimém: «Se Nabuzardan, o cozinheiro-chefe, não tivesse vindo, não se teria incendiado o templo do Senhor (2Rs 25,8-10). Isto quer dizer: se o deleite da gula não entrasse na alma, a mente não cairia quando impugnada pelo inimigo.

17. Do Abade Poimém contavam que, convidado a comer quando não o queria, aquiesceu, embora em prantos, a fim de não deixar de atender ao irmão e não o contristar.

18. Disse mais o Abade Poimém: «Não habites em lugar onde vês que alguns têm inveja de ti; senão, não progredirás».

19. Alguns referiam ao Abade Poimém que certo monge não bebia vinho. Respondeu: «O vinho em absoluto não é para os monges».

20. O Abade Isaías interrogou o Abade Poimém a respeito dos pensamentos impuros. Este respondeu: «Se tivermos um baú cheio de vestes e as deixamos fechadas, apodrecerão com o tempo. Assim também são os pensamentos: se não executamos com o nosso corpo, no decorrer do tempo extinguem-se ou apodrecem».




  1. Lavar-se nos balneários das cidades era antigamente sinal de luxo. 

  2. Isto é, as tentações não nos podem ser nocivas, enquanto não lhes prestamos nossa cooperação.