Morte de João Batista

JOÃO BATISTAMORTE

Roberto Pla: Evangelho de ToméLogion 46

Segundo o testemunho joanico, os dois primeiros discípulos de Jesus, dos quais derivou logo o núcleo de discípulos, eram provenientes do Batista. Este é o processo que cabe esperar segundo a sucessão oculta. O Batista significa a imersão nas águas da alma e Jesus o batismo superior do espírito, que somente pode dar-se quando o lavado psíquico concluiu.
*Quando, pois, o Senhor soube que os fariseus tinham ouvido dizer que ele, Jesus, fazia e batizava mais discípulos do que João (ainda que Jesus mesmo não batizava, mas os seus discípulos) deixou a Judeia, e foi outra vez para a Galileia. (Jo 4:1-3).
*Assim se adverte que Jesus não batizava com água, senão seus discípulos.

A diferença de nível entre os discípulos se faz notória em algumas divergências radicais, como ocorre com a discussão plantada sobre o jejum que Jesus resolve com o exemplo parabólico do noivo (v. nesteia). Quando o homem sumido no Espírito, é como uma cana agitada pelo vento (o espírito), tem a consolação do noivo e não jejua do banquete messiânico. Mas os discípulos de João — os “filhos” de João — só estão ainda com os preparativos da sala, na ausência, não só do noivo, senão de seu parente, o “sopro” por ele enviado.

Tudo isso se esclarece bastante no importante “ultimo testemunho de João” que proporciona o quarto evangelho. Com o uso do exemplo místico do noivo que utiliza também Jesus, declara o Batista sua natureza terrena, de homem “nascido de mulher”, sua condição psico-somática.

João é ainda o arquétipo do homem psíquico e prova disto é que segue batizando, mas subiu às “fontes”, à origem das águas, onde é possível decifrar os segredos do nascimento da alma.
*Ora, João também estava batizando em Enom, perto de Salim, porque havia ali muitas águas; e o povo ia e se batizava. (Jo 3:23). Este Enom ou Ainon, quer dizer, “nas fontes”.

Em João há agora um processo evidente se se compara este último testemunho com o primeiro. Agora já não aparece como aquele “homem psíquico” incapaz de afirmar de si mesmo outra coisa que não seja o lamento de Isaías: “Eu sou, uma voz que clama no deserto”. O texto joanico do último testemunho é determinante. João é agora o amigo do noivo eterno, algo próximo que ouve a voz do noivo até o ponto de que o noivo, eterno, deve crescer e o amigo do noivo, terreno, “diminuir”. O mito solar reaparece para ser cumprido em seu sentido superior místico. João Batista adquiriu a aceitação firme do testemunho do que vem do céu, o Filho, e sabe que “o que crê no Filho tem vida eterna”.

Para arrematar este processo da alma segundo o explica o evangelho, o único que resta por cumprir é a morte psíquica, a transferência de sua consciência ao “nascido do céu” como fruto de varão. Este será o prólogo de sua assunção verdadeira no Filho. A outra morte, a somática, tão bem relatada em Marcos, é o tributo que o mortal há de pagar à morte, e o fará com gosto se sua psique está avançada em seu ato de transferir a consciência ao Filho do homem.

Desde “saborear a morte” quando se vê vir o Filho do homem em seu Reino, fala Jesus em várias ocasiões. Para o que morre todos os dias um pouco não há morte senão cessação, quer dizer, há morte, mas com o aguilhão perdido.