Evangelho de Tomé – Logion 15

Jesus disse: quando víreis aquele que não foi engendrado de mulher, prosternai-vos sobre vosso rosto e adorai-o: este é o vosso pai. Roberto Pla


EVANGELHO DE JESUS: João Batista

…os segredos do seu coração se tornam manifestos; e assim, prostrando-se sobre o seu rosto, adorará a Deus, declarando que Deus está verdadeiramente entre vós. (1Cor 14,25)


Roberto Pla

Os não engendrados de mulher, aqueles que disse Jesus que o menor deles era maior que o maior entre os nascidos de mulher, são os filhos da promessa, os quais se contam como descendência de Deus. Isto é, não são os filhos da carne que são filhos de Deus; mas os filhos da promessa são contados como descendência (Rom 9,8). Isto o confirma o Salmo quando o Senhor diz ao fruto de Davi: «Tu és meu Filho, hoje te gerei.» (Sl 2,7)

Estes filhos vindos de Deus se constituem em todos os casos, dada sua condição de ser fruto do seio do varão, no Senhor do homem adâmico em quem se desenvolveram como fruto da semente semeada por Deus neles, até chegar a formar inteiramente um homem novo, segundo e celeste, vindo depois do primeiro homem, o homem velho, terreno. (v. ADÃO ALMA VIVENTE – ADÃO ESPÍRITO VIVIFICANTE)

O homem do céu é segundo só se se atém a sua ordem de aparição ascendente visto desde a terra; mas se se olha desde o alto, como Filho do Homem feito no sexto dia da criação, é o primeiro, pois precedeu em tempo e proximidade a Deus, ao Adão do Paraíso.

Talvez seja este o motivo de que a tal Filho do Homem, vindo do céu, se o chame Primogênito de toda criação, feito a imagem de Deus invisível1.

Tudo isto o explica muito bem Paulo quando expõe qual é em seu entender o plano salvífico de Deus quanto ao homem. São chamados todos aqueles que o amam, e todos podemos amá-lo, pois de antemão fomos predestinados a reproduzir a imagem de seu Filho. Este, seu Filho, é no homem, o homem pneumático ou Filho do Homem que como cordeiro de Deus se faz carne (Jo 1,14) em cada homem que vem a este mundo. Assim pois, cada homem é, portanto, o homem completo e trino que inscrito em sua vestidura carnal e formando parte dela por identificação, conhece a Cristo manifesto segundo a carne.

Logo, em virtude de uma nova, segunda, criação (ou regeneração), imputável tanto à intervenção inspiradora de Deus para bem dos que o amam, como a uma designação que convém de maneira natural aos chamados, é dada a estes a graça de estar em Cristo por meio de uma transformação do velho no novo. Esta transfiguração da consciência permite ao novo não só conhecer a Cristo segundo a carne, senão também segundo o espírito. Os que assim conhecem a Cristo são também conhecidos — elegidos — por Deus, pois foram predestinados a reproduzir em todos os escalões de si mesmos a imagem do Filho (Rm 8,28-29; 2Cor 5,16-17).

Para quem é conhecido por Deus, seu rosto (o próprio rosto do eleito que é conhecido), e o Filho são uma só coisa enquanto que a imagem reproduzida é meramente uma luz limitada sobre a vestidura própria e visível do Adão de palha e de barro.

A imagem verdadeira é oculta mas se mostra, se faz manifesta, pela dupla ação aprofundadora do batismo de água e de espírito. Esta ação é a que faz possível, ao final, que o Filho seja visto, bem entendido que ao dizer ver se alude aqui ao fato de discernir com os olhos do conhecimento ao Filho até então oculto para a consciência. Este último está explicado como plano de Deus no evangelho joanico: Esta é a vontade de meu Pai: que todo o que veja ao Filho e creia nele, tenha vida eterna (Jo 6,40).

Na metanoia (ou metanoesis) encomendada por Jesus como começo da penetração nos objetivos fixados pela Boa Nova, estão os traços essenciais de uma contemplação atenta a todo acontecimento interior, cuja finalidade última é o reconhecimento da imagem ou rosto da primeira criação.

Esta finalidade se cumpre quando o Filho é visto como resultado de uma vigilância ininterrupta, de um estar atento em adoração acesa na chama viva. Este ato é correlativo do esquecimento ou negação de si mesmo — do homem velho — que Jesus põe como condição ao que pretende segui-lo. Há que entender esta negação como uma ruptura das fronteiras próprias, que se veem arrasadas pelo conhecimento ou pelo amor, em alas de universalidade que seguramente constitui a essência do Filho do Homem. Por isso disse Jesus aquilo de que: Se o grão de trigo não cai na terra e morre, fica ele só; mas se morre dá muito fruto (Jo 12,44) (v. Despertar Morrer Nascer).


  1. Col 1,15. A morte dos primogênitos relatada em Ex 12,29-30, é figura, até certo ponto, da degola ou morte desta classe de filhos do alto. Também é este o sentido alegórico da progenitura reconhecida a Jacó ainda sendo segundo e desdenhada por Esaú, o primeiro a nascer.